Carlos Wizard Martins, uma das 14 pessoas oficialmente investigadas pela CPI da Covid, prefere se apresentar como empreendedor social, mas ele é mais conhecido como um bilionário.
Ele ganhou o título — com direito a menção na lista da Forbes americana — quando vendeu no fim de 2013 o grupo Multi por R$ 1,95 bilhão para a editora britânica Pearson.
Das empresas de educação e tecnologia do Multi, a mais conhecida era a franquia de escolas de inglês Wizard, à qual Wizard, o empresário, é associado até hoje — para desgosto dos novos donos.
Mas seus negócios hoje vão muito além do ensino de idiomas. Ele ainda mantém um pé no ramo, mas administra com os filhos investimentos e empresas de varejo, esportes, cosméticos, logística, alimentação e serviços financeiros.
A família tem uma rede de negócios que envolve o ex-jogador de futebol Ronaldo, o jogador Neymar e Marcos Buaiz, marido da cantora Wanessa.
O centro da operação é a holding Sforza, que Wizard administra com 2 dos 6 filhos: os gêmeos Charles e Lincoln, de 41 anos. Sua mulher, Vânia, também é sócia.
A holding foi criada quando os Wizard compraram a rede de produtos naturais Mundo Verde, em 2014, depois da venda do grupo Multi.
Nos anos seguintes, eles compraram participações em empresas, venderam em outras e lançaram novos negócios.
“O que levei 27 anos para construir da primeira vez foi superado em três anos”, afirmou o curitibano de 64 anos em entrevista ao jornal Valor Econômico.
Os negócios dos Wizard
A Sforza hoje controla a Mundo Verde, a operação da Taco Bell no Brasil, a Rainha e a Topper (marcas pelas quais pagou R$ 260 milhões) e a Ronaldo Academy, franquia de escolas de futebol que leva o nome do ex-jogador.
Nos dois últimos negócios, tem como sócio Marcus Buaiz, de quem Charles comprou metade da participação na Act10n, uma agência de celebridades.
O filho de Wizard tentou outro voo solo com quando lançou a Neymar Sports, também uma franquia de escola de esportes que licencia a imagem do jogador da seleção. Mas o projeto não saiu do papel.
A Órion é o braço de investimentos imobiliários da família Wizard, e a Aloha, uma marca de venda direta de cosméticos e óleos essenciais tocada pelas filhas de Wizard, Thaís e Priscila.
A Sforza também tem participações no banco digital Social Bank, na empresa de galpões de logística Logbras e na Wiser, formada pelas redes de escolas de inglês Wise Up e Number One e que tem o Itaú como sócio.
Em dezembro do ano passado, a Sforza vendeu a empresa de serviços financeiros Hub por R$ 290 milhões para o Magazine Luiza. A empresa tinha sido criada por Charles em 2012, ainda como um negócio de cartões de vale-presente.
Carlos, Charles e Lincoln ainda possuem ações, desta vez individualmente, da International Meal Company (IMC) — as cotas variam entre 2,8% e 3,2%.
A empresa é dona de franquias de restaurantes de comida rápida no Brasil e comprou da Sforza em 2019 as operações do KFC e da Pizza Hut, que a família Wizard tinha adquirido um ano antes. Os valores não foram revelados.
A Sforza e Carlos Wizard foram procurados pela reportagem, mas não quiseram comentar.
Campanhas de boicote
O envolvimento de Wizard na política faz com que suas empresas fossem alvo de boicote nas redes sociais.
Ele é uma figura frequente na órbita de Bolsonaro e amigo do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que chegou a convidar o empresário para ser seu secretário.
Não foi diferente depois de seu depoimento à CPI, em que, afora uma breve fala inicial em sua própria defesa, Wizard preferiu não se manifestar para não se incriminar, porque é investigado pela comissão.
“Um protesto muito eficiente contra o silêncio de Carlos Wizard é deixarmos de gastar dinheiro nas empresas que ele comanda”, diz uma das publicações.
Wizard foi e ainda é muito criticado por suas opiniões sobre a pandemia de covid-19.
Ele defendeu o uso de um suposto tratamento precoce, foi contra o isolamento social e duvidou do número de mortos no Brasil — em junho do ano passado, quando chegou a sugerir a recontagem das 35 mil vítimas fatais registradas até então.
As campanhas de boicote voltaram com força depois que tudo que o empresário fez ou disse na pandemia foi revisitado pela CPI.
“Quando você se revoltar ao ver o vídeo do Wizard rindo enquanto fala por mortos por covid, lembre que ele é dono (da) Mundo Verde, KFC, Pizza Hut, Taco Bell, Topper, Rainha… Boicote já!”, diz outro post.
Por isso, empresas tentaram rapidamente corrigir os equívocos e se distanciar de Wizard.
A IMC disse à BBC News Brasil que, “ao contrário do que vem sendo divulgado erroneamente, as redes KFC e Pizza Hut não fazem parte da Sforza”.
“Wizard não atua na gestão da empresa e em seu conselho de administração. Dessa forma, a participação do empresário em grupos ou ações ligadas à covid-19 é uma iniciativa pessoal e não tem qualquer relação com a IMC e suas marcas”, afirmou a companhia.
Quem faz uma busca hoje no Google pelo nome de Carlos Wizard encontra no topo dos resultados um anúncio da rede de escolas de inglês que diz que “a Wizard pertence a Pearson desde 2014, e nosso posicionamento é muito diferente de Carlos Martins”.
“A Wizard by Pearson aproveita a oportunidade para se expressar em favor da vida, da saúde e da ciência”, afirma a empresa.
Até mesmo a Mundo Verde, que hoje é presidida por Lincoln, fez isso. Foi em junho de 2020, antes de o filho de Wizard assumir a presidência.
A companhia publicou um comunicado em suas redes sociais dizendo que Wizard é seu acionista, mas não atua na gestão da empresa. Também afirmou que não tem qualquer relação com governos e partidos, posicionamento que será mantido pela marca”.
A empresa disse à BBC News Brasil que não fala mais sobre o assunto.
Vacinas e CPI
Em público, Carlos Wizard parece estar mais dedicado a outros projetos, entre eles sua carreira como guru de negócios.
Ele é autor de livros como Desperte o milionário que há em você, Sonhos não têm limite (sua autobiografia), Do zero ao milhão e Meu maior empreendimento — e levou uma bronca dos senadores por tentar promover um deles na CPI.
Também costuma dar lições a quem deseja ser um empreendedor de sucesso por meio de suas redes sociais. Tem 287 mil seguidores no Instagram e 109 mil no Facebook.
Sua empreitada mais recente na área é a WizarBell, escola de negócios que tem em parceria com Ricardo Bellino, fundador da agência Elite Models no Brasil e ex-sócio de Donald Trump.
Bellino diz à BBC News Brasil que ele e Wizard se conheceram há 13 anos e que se aproximaram pelo interesse no empreendedorismo. Os dois dão palestras sobre o assunto.
Ele elogia as missões de Wizard como líder da igreja mórmon e a trajetória de sucesso do seu sócio, que começou como professor de inglês e hoje é um megainvestidor — Wizard fez parte do elenco do programa Shark Tank, em que empreendedores tentam convencer empresários-celebridades a apostar em seus negócios.
Mas Bellino prefere não comentar sobre as acusações feitas ao sócio na CPI. “Não converso sobre pandemia com Wizard”, afirma.
“O que posso dizer apenas é do que testemunhei sobre as suas intenções de acelerar o processo de vacinação.”
Ele se refere à campanha encabeçada por Wizard e pelo empresário Luciano Hang, dono da rede de varejo Havan — e um dos principais aliados de Bolsonaro — para emplacar no Congresso a permissão para que empresas privadas comprem vacinas para imunizar seus funcionários, doando uma parte para o governo.
O projeto de lei foi aprovado na Câmara dos Deputados e está no Senado, sem data para ser votado.
Carlos Wizard foi criticado várias vezes pelos senadores em seu depoimento à CPI por causa disso. De todos, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) foi a mais incisiva.
Ela disse que o empresário, um homem “de posses”, dono de “um patrimônio muito importante”, queria favorecer uma pequena parcela do setor privado em detrimento dos mais pobres.
“Isso é totalmente contrário ao que o senhor disse agora sobre o senhor Jesus Cristo”, afirmou a senadora, que também é cristã — Wizard permaneceu calado.