Bolsonaro falou com a imprensa em Dubai, após visitar a Expo 2020. Ele reclamou que o Brasil foi ‘atacado na COP 26’, a conferência do clima da ONU; país registrou alertas de desmatamento recorde em outubro.
O presidente Jair Bolsonaro disse neste sábado que o governo não tem como pagar R$ 90 bilhões de precatórios em 2022 sem furar a regra do teto de gastos. Ele também avaliou que a PEC dos Precatórios, que diminuiria esse valor, é “mais difícil” de passar no Senado do que na Câmara, onde foi aprovada nesta semana.
O valor de R$ 90 bilhões é o quanto o governo teria que pagar em 2022, se a PEC não for aprovada. Com a aprovação da PEC, a quantia cairia para R$ 44 bilhões.
Precatórios são dívidas do governo já reconhecidas pela Justiça e de pagamento obrigatório, de acordo com as regras atuais. Todo ano, o montante de precatórios já reconhecido pela Justiça é incluído como despesa no Orçamento da União, como manda a Constituição.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios prevê duas principais mudanças com relação à legislação em vigor. A primeira é estabelecer um limite para o pagamento dos precatórios em cada ano. A segunda é a alteração da regra do teto de gastos públicos. Com isso, o governo ganha espaço fiscal para gastar mais no ano que vem – ano eleitoral – e pagar um Auxílio Brasil de R$ 400.
“A gente não tem como pagar 90 bilhões ano que vem dentro do teto, porque ia parar tudo no Brasil. Será que o objetivo é parar tudo no Brasil? Estamos no parlamento negociando isso”, afirmou o presidente.
“É mais difícil [aprovar no Senado], sabemos disso. E olha só: dívidas de até R$ 600 mil, vamos pagar todas”, completou.
O presidente, a exemplo do que vem fazendo em falas recentes, alegou que os processos dos precatórios foram se acumulando ao longo dos anos e, “de repente”, caíram para o governo dele pagar. “Dívida do tempo do governo Fernando Henrique Cardoso. Essas dívidas acumularam e, de repente, o Supremo Tribunal Federal fala ‘o Bolsonaro tem que pagar'”, argumentou o presidente.
Despesa previsível
Mas não é assim que funciona. Os precatórios são julgados em processos muitas vezes longos, e não são decididos de um dia para o outro. Todos os governos recentes tiveram que pagar precatórios.
“A Advocacia Geral da União acompanha as ações desde o início até o desfecho. A Lei de Diretrizes Orçamentárias possui um anexo sobre riscos. Não há surpresa”, afirma o diretor-executivo da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco.
Ele explica que havia alternativas para o governo pagar os precatórios integralmente. “O governo poderia e deveria ter negociado os precatórios antes da condenação irreversível. Poderia resolver a questão interpretando que os precatórios do Fundef estariam fora do teto, adotando o parcelamento que já está previsto na Constituição, reduzindo despesas discricionárias, diminuindo os subsídios e, em entendimento com o Congresso, reduzindo o montante das emendas parlamentares”, explica o especialista em contas públicas.
“Mas, às vésperas de ano eleitoral, o governo e o Congresso não querem cortar despesas. Pretendem aumentá-las”, completa Castello Branco.
COP 26
Na entrevista, Bolsonaro reclamou que o Brasil foi “atacado” na COP 26, a Conferência do Clima organizada pela ONU, em Glasgow.
Bolsonaro não foi à COP, mas integrantes do governo representaram o país. A gestão de Bolsonaro vem sendo criticada pela comunidade internacional desde 2019, quando começou o governo, em razão da postura do presidente em relação ao meio ambiente.
Nos últimos anos, os números do desmatamento da Amazônia vêm apresentando sucessivos recordes negativos. A estatística mais recente, divulgada nesta sexta-feira (12) pelo Inpe, apontou registro recorde de alertas de desmatamento para um mês de outubro.
““COP-26, né? Ali é um local onde quase todos apresentam os problemas para os outros resolverem. Você pode ver, China, India, Estados Unidos não assinaram nada. Nós somos os que mais contribuímos para a não emissão de gases de efeito estufa e que, por vezes, mais pagamos a conta, mais somos atacados”, afirmou o presidente.
A fala de Bolsonaro deixa de mencionar que Estados Unidos e China assinaram, na quarta-feira (10), na COP 26, um acordo de compromisso contra a liberação de carbono na atmosfera. Os dois países são os principais emissores de gases do efeito estufa do planeta.
Segundo o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa, do Observatório do Clima, o Brasil continua a aumentar o total de gás carbônico (CO2) emitido para a atmosfera, mesmo tendo assumido compromissos de redução há mais de uma década.
O levantamento mostrou também que o valor das emissões de gases do efeito estufa pelo Brasil em 2020 foi o maior desde 2006. O aumento do desmate na Amazônia e no Cerrado são as principais causas.
Segundo o Observatório do Clima, desde 2010 o Brasil elevou em 23,2% a quantidade de gases de efeito estufa que despeja na atmosfera todos os anos.
Viagem ao Oriente Médio
Bolsonaro chegou neste sábado Dubai, por onde começa sua viagem oficial de uma semana ao Oriente Médio. Depois ele vai para Abu Dhabi, Bahrein (a capital, Manama) e Catar (a capital, Doha).
No primeiro dia em Dubai, o presidente visitou a Expo 2020, a feira universal, um dos maiores eventos realizados no mundo desde a pandemia de Covid.
Na Expo 2020, Bolsonaro se encontrou com o emir de Dubai e primeiro-ministro dos Emirados Árabes, Mohammed bin Rashid Al Maktoum.
Na ocasião, Bolsonaro condecorou o líder árabe com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul. A honraria, concedida a estrangeiros, é a mais alta condecoração brasileira atribuída a cidadãos estrangeiros.
Presidente Jair Bolsonaro em reunião bilateral com o Emir de Dubai, Mohammed bin Rashid Al Maktoum — Foto: Alan Santos/PR
Hotel em que o presidente Jair Bolsonaro e a primeira-dama Michele Bolsonaro estão hospedados em Dubai — Foto: Guilherme Mazui/g1