O Departamento de Justiça também deve publicar em breve uma legislação conhecida como “bandeira vermelha”, que deve servir de modelo para que os 50 estados americanos redijam suas próprias versões de relatórios sobre tráfico de armas
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou nesta quinta-feira (8) uma série de ações executivas para conter a violência armada, depois que dois ataques a tiros no mês passado, em Atlanta e Boulder, somaram 18 vítimas às estatísticas de mortes por armas de fogo no país.
“A violência armada neste país é uma epidemia”, disse Biden, acompanhado da vice-presidente Kamala Harris e do secretário de Justiça Merrick Garland, durante o pronunciamento na Casa Branca. “Se o Congresso agir ou não, eu vou usar todos os recursos à minha disposição para fazer com que os americanos fiquem seguros.”
Entre as novas regras anunciadas pelo presidente, está uma que será elaborada pelo Departamento de Justiça nos próximos dias para ajudar a reduzir proliferação das “armas fantasmas”, kits com peças e instruções que permitem ao comprador montar o próprio armamento e, assim, driblar a fiscalização das autoridades.
Outra regra a ser validada dentro dos próximos 60 dias determina que armas equipadas com os dispositivos conhecidos como “cintos estabilizadores”, que tornam os disparos mais precisos e, portanto, mais letais, estarão sujeitas aos requisitos da Lei Nacional de Armas de Fogo.
O autor do ataque em Boulder, no Colorado, que matou dez pessoas em um supermercado em 22 de março, usava um desses cintos estabilizadores, de acordo com as autoridades. Na prática, esses dispositivos transformam pistolas em fuzis de cano curto, o que aumenta seu potencial de dano.
O Departamento de Justiça também deve publicar em breve uma legislação conhecida como “bandeira vermelha”, que deve servir de modelo para que os 50 estados americanos redijam suas próprias versões de relatórios sobre tráfico de armas.
A lei de bandeira vermelha permite que tribunais e autoridades locais para remover o acesso a armas de pessoas consideradas perigosas para si mesmas ou para a comunidade.
Para que esse tipo de legislação entre em vigor em âmbito federal, Biden precisa de um aval do Congresso, mas o objetivo, segundo a Casa Branca, é facilitar o caminho para os estados que queiram implementar as mudanças de imediato.
Além disso, propostas que endureçam de alguma forma o controle de armas nos EUA esbarram na oposição do Partido Republicano e de grupos lobistas, como a Associação Nacional do Rifle (NRA).
No mês passado, por exemplo, a Câmara, de maioria democrata, aprovou dois projetos de lei: a ampliação da checagem de antecedentes de quem compra armamentos pela internet ou em feiras e o aumento do prazo entre a venda e a entrega, para até dez dias, dando mais tempo para analisar o histórico do comprador.
No Senado, porém, os projetos estão parados. Dos 100 assentos da Casa, 50 são de republicanos, 48, de democratas, e 2, de independentes que votam com o partido governista. O voto de desempate, quando necessário, é dado pela vice-presidente Kamala Harris, o que concede ligeira vantagem aos correligionários de Biden.
Uma regra de obstrução, porém, faz com que a maior parte das leis precise de 60 votos para ser aprovada. Assim, republicanos podem usar a manobra para bloquear propostas, já que pelo menos dez deles teriam que votar com os democratas para avançar os projetos.
Em sua primeira fala após o ataque no Colorado, Biden insistiu que a legislação sobre armas não deveria ser uma questão de divergências partidárias. “Eu não preciso esperar mais um minuto –muito menos uma hora– para tomar medidas de bom senso que salvarão vidas no futuro e insto meus colegas na Câmara e no Senado a agirem”, disse, na ocasião.
A NRA disse que está pronta para questionar na Justiça as ações anunciadas pela Casa Branca. “Biden deixou claro que seu objetivo é restringir os direitos dos proprietários de armas cumpridores da lei, ao mesmo tempo em que ignora os criminosos e renuncia a medidas substantivas que realmente manterão os americanos seguros”, disse a organização, por meio de sua porta-voz Amy Hunter.
O grupo ainda criticou a indicação de David Chipman, atualmente assessor de uma organização que defende o controle de armas, para chefiar o ATF, órgão responsável pela aplicação de leis relativas ao álcool, tabaco, armas de fogo e explosivos.
A confirmação de Chipman para o cargo, no entanto, também precisa de aprovação no Senado –neste caso, por maioria simples. Embora convencer um único senador republicano a votar com os democratas pareça bem mais fácil do mudar o voto de dez nos casos de aprovação de leis, o aval da Casa ainda é incerto.
O ATF está desde 2015 sem um diretor permanente. Além disso, desde 2006, quando os legisladores decidiram que o cargo de chefia no ATF é uma indicação política e, portanto, demanda confirmação do Senado, apenas uma pessoa conseguiu o aval dos senadores: B. Todd Jones, indicado por Barack Obama.
O ex-presidente Donald Trump chegou a retirar a indicação de Chuck Canterbury, do maior sindicato de policiais americanos, depois que ele se recusou a descartar totalmente a possibilidade de expandir os critérios para a permissão de compras de armas, como a verificação de antecedentes.