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O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quarta-feira (8) a adoção pelo governo federal de cinco medidas para proteger as comunidades indígenas e evitar a mortalidade pela Covid-19.
As medidas fixadas pelo ministro são:
- instalar uma Sala de Situação para a gestão de ações de combate à pandemia quanto a povos indígenas em isolamento ou contato recente. Esta espécie de gabinete de crise deve contar com a participação de comunidades indígenas, Procuradoria Geral da República (PGR) e Defensoria Pública da União (DPU). Os membros deverão ser escolhidos no prazo de 72 horas a partir da ciência da decisão, e a primeira reunião virtual deve ocorrer em até 72 horas depois da indicação dos representantes;
- no prazo de 10 dias contados a partir da notificação sobre a decisão, o governo deve ouvir a Sala de Situação para elaborar um plano com criação de barreiras sanitárias em terras indígenas;
- em 30 dias a partir da notificação sobre a decisão, o governo deve elaborar um Plano de Enfrentamento da Covid-19 para os Povos Indígenas Brasileiros. O plano deve ser feito com a participação das comunidades indígenas e do Conselho Nacional de Direitos Humanos. Os representantes das comunidades devem ser definidos em 72 horas a partir da ciência da decisão;
- estabelecer, no âmbito do Plano de Enfrentamento, medidas de contenção e isolamento de invasores em relação a terras indígenas;
- garantir que indígenas em aldeias tenham acesso ao Subsistema Indígena de Saúde, independente da homologação das terras ou reservas indígenas; já os indígenas que não são aldeados também devem acessar o subsistema caso não haja oferta no SUS geral.
Os prazos são contados em dias corridos. O ministro concedeu uma liminar (decisão individual) em uma ação apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e por seis partidos: PSB, PSOL, PC do B, Rede, PT, PDT.
O grupo afirmou que a taxa de mortalidade pelo coronavírus entre os povos indígenas é de 9,6%. Já na população brasileira em geral é de 5,6%. De acordo com a Apib, o país tem mais de 10 mil indígenas contaminados.
Nesta quarta, o presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, a lei com medidas de proteção a povos indígenas durante a pandemia do coronavírus.
Para justificar os vetos, o Executivo argumentou que o texto criava despesa obrigatória sem demonstrar o “respectivo impacto orçamentário e financeiro”, o que seria inconstitucional.
Os autores da ação no STF citam que o contágio da doença nas comunidades tradicionais ocorre em grande velocidade, em meio à expansão da pandemia para o interior do país.
No último sábado (5), atendendo a um pedido de informações do relator, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou não haver omissão do governo federal na adoção de medidas de enfrentamento à pandemia em comunidades indígenas. O órgão também afirmou que medidas de saúde e segurança estão sendo regularmente desempenhadas pelo poder público.
Barroso pediu que o caso seja incluído na pauta de julgamentos de agosto do Supremo já que o tribunal está em recesso. Para o ministro, a população indígena em situação de isolamento ou contato recente estão mais expostos e devem ser protegidos.
Segundo o ministro, o Ministério da Defesa informou que foram adotadas barreiras sanitárias fluviais, mas sem um planejamento de proteção desses povos. No entanto, Barroso ressaltou a importância da atuação das Forças Armadas na distribuição de suprimentos aos povos indígenas.
“Na atual situação, em que há uma pandemia em curso, os povos em isolamento e de contato recente são os mais expostos ao risco de contágio e de extinção. Isso ocorre em razão das condições de vulnerabilidade imunológica e sociocultural já narradas. Por essa razão e de acordo com diretrizes internacionais da ONU e da Comissão IDH, a medida protetiva mais eficaz a ser tomada em favor de tais povos é assegurar-lhes o isolamento da sociedade envolvente, por meio de barreiras ou cordões sanitários que impeçam – inclusive com o uso da força, se necessário – o acesso de estranhos às suas terras”, escreveu.
Barroso negou que a adoção das medidas represente uma interferência da Justiça. Isso porque a Sala de Situação sobre indígenas está prevista em portaria do Ministério da Saúde e da Fundação Nacional do Índio (Funai).
O ministro afirmou que atou no caso como “facilitador de decisões e de medidas que idealmente devem envolver diálogos com o poder público e com os povos indígenas, sem se descuidar, contudo, dos princípios da precaução e da prevenção”.
Ele cobrou que a União se organize para combater invasões nas reservas, um problema anterior à pandemia. Ao Supremo, os indígenas falam em 20 mil invasores em apenas uma das áreas de risco de conflito armado.
Barroso classificou o Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo Novo Coronavírus em Povos Indígenas como “vago” e “meras orientações gerais”. A formulação das diretrizes não teve participação de comunidades indígenas, o que é indispensável.
O ministro destacou ser “inaceitável” a falta de prestação de saúde por meio do Subsistema Indígena de Saúde para povos aldeados em terras não homologadas.
“A identidade de um grupo como povo indígena é, em primeiro lugar, uma questão sujeita ao autorreconhecimento pelos membros do próprio grupo. Ela não depende da homologação do direito à terra”, afirmou Barroso. (G1)