SES/REPRODUÇÃO
Qual é a conexão entre a galinha Marylou, de música homônima da banda Ultraje a Rigor; o personagem televisivo Chaves; ecologia; e o novo coronavírus? Tudo. Os temas, que a princípio parecem aleatórios, fazem parte da estratégia que professores da rede pública do Distrito Federal têm adotado para levar conteúdo virtual aos alunos em tempos de isolamento social provocado pela pandemia.
Com o objetivo de manter a atenção dos estudantes, as classes digitais transmitidas pela internet abusam de memes, irreverência e da cultura pop. É o caso da aula sobre relações ecológicas gravada pelo professor de biologia André Barros, na plataforma Google Classroom, adotada pela Secretaria de Educação do DF.
A ferramenta entrou no ar na última quarta-feira (22/04) para 80 mil estudantes do ensino médio. O Metrópoles conversou com professores, coordenadores da área, representantes da Secretaria de Educação, pais e alunos, que avaliaram como a experiência, embora ainda recente, tem impactado a rotina da comunidade escolar.
Entre elogios e observações de que é preciso aprimorar alguns aspectos, a ideia geral é a de que a tecnologia chegou para ficar. E, neste momento de quarentena, representa a melhor opção para que a educação de jovens e crianças não seja completamente prejudicada durante a luta para impedir que a Covid-19 se espalhe ainda mais pela capital do país.
Até a manhã de segunda-feira (27/04), de acordo com a Secretaria de Educação, a plataforma on-line teve 44 mil acessos de estudantes. O tempo médio de cada conexão foi de duas horas e 10 minutos e a expectativa é que, ao longo das próximas semanas, essas estatísticas cresçam, pois, segundo a Secretaria de Educação do DF, 88 instituições públicas oferecem aulas de ensino médio para 79.741 estudantes.
Entre os internautas que fizeram login no sistema, está Luis Eduardo Silva dos Santos, 18 anos, estudante do Centro de Ensino Médio Setor Oeste. “Estou achando a plataforma da Secretaria de Educação excelente. Gostei dos vídeos”, resumiu o estudante. Os alunos acessam a ferramenta e entram em salas virtuais de suas respectivas turmas. Nelas, existe um mural digital e a lista de atividades.
Ao mesmo tempo, Luis está preocupado com o acesso ao ensino superior por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e do Programa de Avaliação Seriada (PAS) da Universidade de Brasília (UnB). “Neste caso, as aulas presenciais fazem falta. Mas precisamos correr atrás para termos uma base boa para as provas.”
A novidade não está isenta de críticas dos usuários. Para a estudante Vitoria Souza Paixão, 16, “o site trava muito e alunos que tiveram dúvidas não conseguiam tirá-las”. Essas questões serão aprimoradas nos próximos dias. Até porque, no DF, o governo avalia a volta das aulas normais apenas em junho, se tudo correr bem. Até lá, serão feitas melhorias na ferramenta.
Vivian Ferreira, 15, por exemplo, acha que o sistema precisa de algumas modificações. Ela achou a ferramenta virtual acessível, embora tenha reclamado do modo de apresentação das tarefas. “Eu contei 68, tudo de uma vez. É meio confuso e algumas atividades não estão claras. Mas gostei da plataforma”, disse.
A mãe de Vivian, a atendente especialista Hellen Dantas, 36, faz a mesma avaliação da filha. “Eu, como mãe, me assustei quando vi. Mas gostei muito. O governo prometeu e entregou.” Do ponto de vista de Hellen, a participação dos pais é fundamental. “A secretaria está disponibilizando o material. Então, cabe aos pais cobrar os estudos dos filhos agora. No caso de Vivian, felizmente, ela é estudiosa”, ponderou.
Quadro (digital) negro
O Centro de Ensino Médio Setor Oeste produz aulas digitais há dois anos, bem antes da pandemia do novo coronavírus. Segundo o diretor da escola, Jacy Braga, a intensão é continuar com os projetos em paralelo à nova plataforma digital da secretaria.
O colégio tem mil alunos. Aproximadamente 650 estão cadastros nas plataformas. Segundo a vice-diretora, Edna Pereira Torres, a escola montou um grupo de WhatsApp com os representantes de turmas para facilitar a comunicação entre os estudantes e os professores.
No Centro Educacional 2 de Sobradinho, a professora de história Elizabeth Pippi da Rosa ficou encantada com as novas possibilidades do ensino digital ao ver o material postado pela secretaria.
“Para tratar da Primeira Guerra Mundial, fizeram memes esclarecendo o conteúdo”, contou. Elizabeth, agora, prepara as primeiras atividades para postar na ferramenta. “A minha ideia é publicar um vídeo do material do Senado, muito bem elaborado, e uma enquete sobre o conteúdo. Vou solicitar aos alunos, a partir de uma imagem, que façam uma interpretação utilizando outros elementos. Pode ser meme, podcast ou outras formas”, contou.
Colega de Elizabeth, o professor de física Cláudio Cabral já trabalha o conteúdo digital com os alunos. Segundo ele, como as aulas virtuais não têm a mesma dinâmica das presenciais, exigem mais criatividade e jogo de cintura dos docentes.
Material permanecerá no ar
Segundo Gerson Vicente de Paula Júnior, assessor de Relações Institucionais da Secretaria de Educação, a plataforma digital ficará no ar mesmo após o retorno das aulas. “Será um legado”, pontuou.
Pelas contas da pasta, 6 mil professores estão capacitados para a plataforma. Desses, 4 mil acessaram as contas para a produção de conteúdo digital. “Ainda não temos registro de lives com os alunos. Mas a plataforma permite essa ferramenta”, completou.
Após a fase de implantação para o ensino médio, a pasta pretende ampliar o acesso para os alunos dos últimos anos do ensino fundamental nas próximas semanas. Futuramente, a intenção é garantir acesso para todas as turmas.
Chats
Sobre a dificuldade de parte dos alunos para tirar dúvidas, Gerson afirmou que a plataforma possui um canal de chat da turma e de conversa direto com o professor. “É uma ferramenta nova, por isso é natural não estarem familiarizados com todos os recursos ainda”, disse.
Quanto à apresentação do conteúdo, a pasta divulgou um guia de estudos na página do aplicativo. “Todo o conteúdo segue a mesma base curricular das aulas convencionais. Mas vamos produzir material complementar e suplementar com foco no Enem e no PAS”, antecipou.
Segundo Gerson, a plataforma foi cedida pelo Google gratuitamente para a Secretaria de Educação e não haverá cobrança pelo serviço. No caso dos alunos que não têm acesso à internet, a pasta prometeu enviar material didático especial para as família. Mas não há data para o começo da distribuição.
Metrópoles