Pelo menos 20 mil pessoas estão hospitalizadas no SUS pela doença, segundo levantamento do GLOBO; Rio de Janeiro tem 79% dos leitos de Unidades de Terapia Intensiva ocupados e São Paulo tem maioria dos pacientes internados na rede privada
RIO — Nos últimos dias de 2020, ao menos seis estados e o Distrito Federal têm ocupação acima de 80% nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) para Covid-19 da rede pública. A informação é do levantamento do GLOBO, com informações das secretarias estaduais de saúde de 24 estados e do DF, realizado entre segunda (28) e terça-feira (29). Os dados também mostram que pelo menos 20 mil pessoas estão hospitalizadas no SUS com a doença provocada pelo coronavírus, incluindo leitos de UTI e de enfermaria.
Os estados com níveis críticos de ocupação nas UTIs são Mato Grosso do Sul (93,8%), Amazonas (92,9%), Santa Catarina (83,2%), Paraná (83%), Pernambuco (82%) e Espírito Santo (81,9%). Em Brasília a taxa é de 89,31%, e no Rio de Janeiro de 79%.
Em Manaus (AM), o prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB) afirmou à TV Globo que há risco de o sistema de saúde no estado entrar em colapso, exatamente como em abril, no pico da pandemia. A especialista em Saúde Pública da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e colunista do GLOBO Ligia Bahia afirma que a situação atual da pandemia no Brasil — com um número elevado de casos e “sem retaguarda assistencial” — é impressionante.
— Estamos há 10 meses da ocorrência do primeiro óbito e até agora não houve organização adequada do sistema de saúde para atender as demandas. Sabíamos que o aumento de casos aconteceria novamente. Não teve lockdown, as medidas de prevenção não foram adotadas. Os dados mostram uma desmobilização de uma fase inicial, quando houve hospitais de campanha e tentativa de abrir leitos — analisa a especialista — Agora estamos em uma situação péssima: é o que estamos chamando de interiorização da pandemia, pois ocorre simultaneamente em vários lugares, inclusive na região Sul, que em abril e maio não ocorria.
Segundo o levantamento, Bahia, Ceará, Sergipe e Rio Grande do Sul encontram- se no limite da zona considerada crítica, com a ocupação das taxas de UTI para Covid-19 na rede pública acima de 70%. No último estado, a situação é ainda pior na rede privada, com 89,6% dos leitos de UTI ocupados.
Amapá, Rondônia, Tocantins, Pará, Roraima e São Paulo não informaram a taxa de ocupação dos leitos de UTI da rede pública para a doença.
Na avaliação da médica, nesse momento governadores, prefeitos e o governo federal devem focar esforços em assegurar atendimento para casos graves, com a reabertura de leitos de UTI.
— Também é necessário o fechamento de algumas atividades. Porque sabemos que se estamos com essa taxa de ocupação hoje, vamos ter uma situação ainda pior daqui a 15 dias, depois das festas de réveillon. Essas medidas são absolutamente urgentes — afirma Ligia Bahia.
Mais de 10 mil internados em São Paulo
Em São Paulo, 10.873 pacientes estão internados devido ao coronavírus, sendo 4.226 em hospitais públicos e a maioria (6.647) em leitos de hospitais particulares.
Segundo levantamento feito pela produção da TV Globo, o estado de São Paulo mantém a média de mais de 10 mil leitos para Covid-19 ocupados desde 1 de dezembro. Antes disso, a última vez em que o estado havia registrado mais de 10 mil pacientes internados simultaneamente foi em 20 de setembro.
Toque de recolher prorrogado
No Paraná, um decreto assinado nesta segunda-feira (28) prorrogou o toque de recolher no estado, das 23h às 5h, por mais dez dias. A medida entrou em vigência em 2 de dezembro, mas não terá validade na virada de ano, entre quinta-feira (31) e sexta-feira (1).
— Não é porque o decreto deixa de viger no dia 31 que nós podemos nos aglomerar — ponderou o secretário de Saúde do Paraná, Beto Preto, segundo informações do G1. — Até agora, em 24 dias do decreto, tivemos um certo controle da situação.
No Mato Grosso do Sul, o governo estadual também decidiu prolongar o toque de recolher das 22h às 5h, por mais 15 dias, para tentar conter o avanço do coronavírus. No estado, a medida que havia sido determinada inicialmente entre os dias 11 e 26 de dezembro vai valer até 9 de janeiro de 2021.
“O momento exige medidas mais restritas, estamos operando no limite da capacidade do Sistema Único de Saúde. O foco é evitar mais mortes”, afirmou o governador Reinaldo Azambuja, em nota.
Para Ligia Bahia, medidas como essa podem ajudar, mas a especialista em Saúde Pública avalia que “já é tarde demais”.
— Com toque de recolher os bares tem que fechar, mas o ideal seria que nem abrissem. Colocar horário ou qualquer medida que signifique fechamento de bares, restaurantes, academia de ginástica e eventos que reúnam mais de 10 pessoas, são válidas. Mas a situação já está incontrolável. Temos festas com mais de 500 pessoas, tudo foi liberado. É importante que se tente de alguma maneira conter, mas sabemos que é difícil. Por isso a importância muito grande da organização dessa infraestrutura assistencial, porque certamente teremos casos graves — afirma.
A médica destaca que além do fechamento de alguns serviços, também deveriam ser revistas as viagens nesse momento.
— Não estamos nas nossas férias normais, as experiências mostram isso. O que aconteceu na Espanha, por exemplo, com o aumento de casos depois das férias, vai acontecer aqui, por isso é importante que as autoridades governamentais se preparem. — afirma Ligia Bahia, e destaca: — As recomendações de proteção devem continuar as mesmas. Estamos com altas taxas de transmissão. É mentira essa história da imunidade de rebanho. Se fosse verdade, não teríamos esse recrudescimento do número de casos e óbitos.
O GLOBO*