Todos os cinco diretores do órgão regulador votaram a favor da aplicação da CoronaVac e do imunizante de Oxford, mas recomendaram que fármacos sejam acompanhados
BRASÍLIA— Por unanimidade, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou neste domingo a autorização para uso emergencial de duas vacinas contra Covid-19 no Brasil. Todos os cinco integrantes da Diretoria Colegiada (Dicol) do órgão votaram a favor da aplicação dos fármacos. A sessão, iniciada às 10h, foi concluída por volta das 15h20m.
Com a decisão da Anvisa, a vacina de Oxford, desenvolvida pela AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford e a capitaneada pela Fiocruz, e a CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac, poderão ser aplicadas em grupos específicos a partir do momento que os laboratórios produtores forem comunicados da decisão.
Relatora dos dois pedidos de autorização, feitos pela Fiocruz e pelo Butantan, a diretora Meiruze Freitas foi a primeira a votar e foi a favor do uso emergencial das duas vacinas. Os diretores Romisom Mota, Alex Campos, Cristiane Jourdan e o diretor-presidente do órgão, Antonio Barra, acompanharam a relatora.
Último a votar, Barra criticou a politização em torno da discussão da vacinação no país. O diretor foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro, que vem travando uma disputa pública sobre a imunização.
— [A aprovação ocorreu] em meio a um cenário de incertezas, agravado por pressões de todas as naturezas, infelizmente muitas vezes motivads por razões outras que não a saúde pública — declarou.
Ele acrescentou:
— Temos vacina. Agora, num futuro concretamente tangível, nossa população contemplada nos parâmetros de uso emergencia poderá ter acesso aos imunizantes sob o símbolo dos centenários intitutos brasileiros certificados por sua agência reguladora.
Ao proferir o voto, a relatora Meiruze pediu aplausos aos servidores do órgão.
— Guiada pela ciência e pelos dados, a equipe de servidores da Anvisa concluiu que os benefícios da vacina superam seus riscos — disse a diretora, antes de aplaudir o trabalho realizado pela equipe técnica da Anvisa.
A diretora afirmou que ainda há incertezas que devem ser ressalvadas, mas frisou que os benefícios dos fármacos superam os riscos.
— Ressalvadas algumas incertezas ainda existentes, os beneficios conhecidos e potenciais das dus candidastas superam os riscos conhecidos de cada uma delas. Entretanto, ambas atendem aos criterios de qualidade para uso emergencial — afrimou a diretora.
Não há alternativa terapêutica, diz relatora
Antes de apresentar o parecer, a relatora destacou que ainda não existe um tratamento contra a Covid-19. A avaliação contraria declarações do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e do presidente Jair Bolsonaro, que recomendam uso de medicamentos sem comprovação científica para combater a doença.
— A pandemia causada pelo Sars-Cov (nome técnico do novo coronavírus) desafia a saúde global. Nosso pais atualmente responde por 10% do total das mortes observadas no mundo. Até o momento, não contamos com alternativa terapêutica para tratar o coronavírus. Assim, compete a cada um de nós em sua esfera de atuação tomar toda as medidas ao nosso alcance para no menor tempo diminuir impacto sobre a vida no nosso país — disse a diretora.
Em seu parecer, a diretora defendeu a vacinação como forma de proteger a população e disse que o imunizante é uma questão de segurança nacional.
— A vacinação contra Covid-19 ajudará de maneira determinante a proteção individual e coletiva. Destaca-se o caráter estratégico de vacinação no profissionais de saúde. O acesso à vacina é questão de segurança nacional.
Ao acompanhar a relatora, Mota destacou que as vacinas são a melhor forma de prevenir doenças infecciosas:
— As vacinas são a forma mais eficaz de prevenir doenças infecciosas, salvando milhões de vidas em todo mundo.
Além de Meiruze, Mota, Campos e Cristiane, o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra, ainda precisa se manifestar. Para serem aprovados, os pedidos precisam obter maioria simples na diretoria, alcançada quando três votos favoráveis foram proferidos.
Área técnica recomendou aprovação
Mais cedo, a área técnica da agência recomendou a aprovação do uso emergencial das duas vacinas destacando a necessidade de acompanhamento próximo dos imunizantes.
A permissão ao uso emergencial das vacinas passa a valer assim que os laboratórios forem comunicados, o que deve ocorrer logo após o fim da reunião deste domingo.
A autorização emergencial de uso permite a imunização apenas em grupos pré-definidos nos estudos entregues à Anvisa. Para comercialização do imunizante e ampla vacinação sem necessidade de especificação de grupos é preciso obter o registro final da vacina.
Órgão recomenda acompanhamento
A agência confirmou a eficácia global da vacina de Oxford em 70,42%. A área técnica também confirmou a eficácia global da CoronaVac, em 50,4%, e destacou que o imunizante deve ser monitorado de perto.
A Anvisa afirmou, no entanto, que o Instituto Butantan não enviou dados importantes sobre a vacina, como informações sobre anticorpos gerados na fase 3 do estudo, quando o imunizante é testado amplamente.
— A recomendação da área técnica é que, tendo em vista o cenário da pandemia, o aumento do número de casos e a ausência de alternativas terapêuticas, que é uma situação de muita tensão quanto aos insumos, a agência recomenda a aprovação do uso emergencial condicionada ao monitoramento e acompanhamento próximo das incertezas — afirmou Gustavo Mendes, gerente de medicamentos da Anvisa.
Entre as “incertezas” apontadas, a área técnica destacou: a duração da proteção proporcionada pela vacina, seu efeito em idosos e outros grupos específicos, como pessoas com comorbidades.
Também não pode ser avaliada a eficácia da vacina em pessoas que já tiveram a doença.A reportagem contactou o Butantan mas ainda não teve retorno sobre as ponderações da Anvisa sobre a CoronaVac.
Na apresentação, o estatístico da Anvisa mencionou que o dado de 50,4% apresentado pela agência é um valor arredondado: o resultado exato foi de 50,39%.
Os dados incluem os voluntários do teste clínico que contraíram a doença, mas tiveram casos leves, o que mostra que o imunizante é capaz de proteger contra formas graves da Covid-19. A vacina supera o índice recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
‘O inimigo é um só’, diz diretor
A expectativa é que a sessão, iniciada às 10h10m, dure cerca de cinco horas, segundo a Anvisa. O primeiro passo é justamente a apresentação pelas áreas técnicas da agência de pareceres sobre os pedidos da Fiocruz e do Instituto Butantan para seus imunizantes.
Após a apresentação da área técnica, a relatora do tema, diretora Meiruze Freitas lerá seu voto. Em seguida, os outros quatro diretores da agência votarão sobre o tema.
Antes do início dos trabalhos, o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, se solidarizou com as famílias que perderam entes durante a pandemia e defendeu uma mudança de comportamento da sociedade para combater a pandemia. No início da pandemia, Barra foi criticado por participar de aglomerações ao lado do presidente Jair Bolsonaro.
— O inimigo é um só. (E) a nossa melhor chance nessa guerra passa obrigatoriamente pela mudança de comportamento social sem a qual, mesmo com a vacina, a vitória não será alcançada — disse Barra Torres.
Nota da Anvisa
Em nota, a Anvisa esclareceu alguns pontos de seu comunicado:
1) Não foram fornecidos “dados suficientes para comparar a capacidade de gerar anticorpos no produtor fabricado pela Insituto Serum, na Índia”
A diretora relatora disse em seu voto que foi enviado para a Anvisa um estudo ponte entre a vacina produzida pelo Serum e a vacina produzida por Oxford.
2) “dificuldade em estabelecer a data de validade do imunizante”
Foram apresentados dados de estabilidade conduzidos com lotes utilizados nos estudos clínicos e com lotes industriais, produzidos posteriormente. Os dados extraídos dos lotes clínicos são representativos, atendendo as diretrizes estabelecidas em legislação da Anvisa, sendo assim possível estabelecer as condições de armazenamento proposta, temperatura entre 2 – 8°C, bem como o prazo temporário de 6 meses de validade, uma vez que os dados dos lotes clínicos ultrapassam 3 meses desde o início dos respectivos estudos, os quais foram apresentados à Anvisa. Cabe ressaltar que os lotes são analisados mês a mês, o que afasta a disponibilização de vacina que não atendam os critérios estabelecidos e aprovados pela Anvisa.