Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Miguel Lucena
O julgamento dos fatos ocorridos em 8 de janeiro deste ano alerta para a necessidade de se distinguir, em cada ação que tomamos, o sonho, a ilusão e a realidade.
Muitas pessoas, inconformadas com o resultado da eleição presidencial, imaginaram que um movimento nas portas dos quarteis impediria a posse de Lula, com uma possível recontagem de votos. Outras queriam, mesmo, um golpe militar, desde que Bolsonaro – e não um general – ficasse à frente do governo.
Essas pessoas não acreditaram, como não acreditam, que a eleição foi limpa, denunciando supostas fraudes nas urnas eletrônicas.
O discurso da fraude foi alimentado ao longo dos anos, desde a derrota de Aécio Neves para Dilma Roussef. Sobre a eleição de Bolsonaro, em 2018, o argumento é que ele teria sido eleito logo no primeiro turno e não foi roubado no segundo porque o TSE não achou uma brecha nos votos em branco para enxertar as urnas de Fernando Haddad.
O bolsonarismo investiu muito na discussão do voto impresso, mobilizando sua base e ao mesmo tempo deixando seus eleitores desconfiados.
Com o resultado das urnas, a desconfiança transformou-se em revolta. E nesse momento apareceram os aproveitadores e vendedores de ilusões, com informações falsas e prazos de 72 horas para os militares de alto coturno tomarem conta do Brasil.
O golpe militar estaria pronto, bastava o povo se mobilizar para que acontecesse o tic-tac.
O 8 de janeiro foi antecedido pelo 12 de dezembro, quando manifestantes invadiram a sede do Departamento de Polícia Federal e o plantão da 5ª Delegacia da Polícia Civil, na Asa Norte, quebrando vidraças, incendiando carros e espalhando um clima de revolta popular.
Quando ocuparam a Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro, invadindo as sedes do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal, os manifestantes imaginavam que as Forças Armadas apareceriam para apoiá-los na tomada do poder. Imaginaram-se heróis a impedir que o Brasil caísse nas mãos dos comunistas para sempre e se tornasse uma Venezuela. Sonharam em ver seus nomes em ruas e praças. Tudo ilusão.
Se alguém desenhou numa prancheta um plano golpista e soprou nos ouvidos de alguns privilegiados, esses sinais não conquistaram a maioria do empresariado, dos políticos e dos tribunais, como aconteceu em 1964, ficando uma parte do povo iludido com a bomba na mão e muitos anos de cadeia para cumprir.