
Miguel Lucena
Bilac não escreveu apenas um verso: lavrou uma certidão de nascimento da língua portuguesa. Ao chamar o idioma de “última flor do Lácio”, ele nos remete ao Lácio, antiga região da Itália onde nasceu Roma e se consolidou o latim, língua que daria origem às línguas românicas. O português surge, assim, como herdeiro tardio desse tronco antigo, uma flor que brotou longe do jardim original.
Inculta, porque deixou para trás a rigidez clássica e se formou no uso cotidiano, no erro repetido até virar regra. Bela, porque mesmo imperfeita canta, mesmo ferida resiste. A língua portuguesa mistura latim com saudade, poeira com lirismo, palavrão com oração.
Não pede licença nem cabe em vasos acadêmicos. Cresce em becos, sertões e esquinas, florescendo na boca de quem nunca leu Bilac, mas sabe amar, xingar e sofrer com precisão poética. Inculta e bela — como o Brasil que a fala.


