*Frutuoso Chaves
Leio sobre o aniversário de Itabaiana, no Baixo Vale do Paraíba, exatamente naquele ponto onde o rio se alarga para o abraço no Sanhauá, 70 quilômetros depois, nos costados de João Pessoa, a Capital. Realmente, gosto dessa cidade. Costumo associá-la às viagens de trem que eu fazia, durante as férias escolares, desde o Recife, onde estudava, até a casa dos meus pais, em Pilar.
A Estação de Itabaiana era, então, a penúltima do meu percurso, antes dos afagos da família e do reencontro com pessoas, paisagens e coisas para mim tão caras. Aos meus dez ou doze anos, Recife me parecia a Sede do Universo, com suas imensas fronteiras, seus desafios e suas novidades. Pilar era o retorno às origens e, Itabaiana, a entrada do porto sabido e seguro para este navegante pequeno e assustado.
Meu pai comprou no comércio de Itabaiana o meu primeiro relógio. Levou-me pela mão ao vendedor, para minha escolha pessoal, numa terça, dia da feira livre mais importante e movimentada do Vale do Rio Paraíba. Mais tarde, eu faria sozinho o trajeto de 12 quilômetros entre as duas cidades ribeirinhas, em busca dos gibis que Pilar não era capaz de me prover.
Na adolescência, morando em João Pessoa, Itabaiana me invadia a alma por intermédio da prosa de José Lins do Rego. Impossível esquecer a figura do Professor Maciel, a cujos cuidados o rude menino de engenho fora posto para o aprendizado das primeiras letras à base da palmatória. E, mal aprendera, outro suplício lhe sobrevinha: o da ordem unida, com o volver de suas “esquerda” e “direita”, ao comando de alguém do destacamento de Polícia a serviço do desfile escolar do 7 de Setembro.
Este, aliás, foi o dia da fuga ao Engenho Corredor (por trem, sempre ele) do menino “Doidinho”, para desgosto do velho Mestre, homem que, em sua aspereza, chorava um insucesso desses como uma prova de incompetência pessoal. Afinal, além da melhor escola da Região, tinha, também, um nome a zelar. Orgulhava-se de fazer qualquer cristão aprender o que quer que fosse, mesmo que tivesse de arrancar o couro do infeliz.
Hoje, quando as palmatórias da vida me afligem a alma e a sina, é ali onde, em pensamento, me refugio: nas duas cidades que embalaram meu sono de menino.
*Jornalista profissional com passagens pelos jornais paraibanos A União (Redator e Chefe de Reportagem), Correio (Redator e Editor de Economia), Jornal da Paraíba (Editorialista), O Norte (Editor Geral), O Globo do Rio de Janeiro e Jornal do Commercio do Recife (correspondente na Paraíba, em ambos os casos). Também pelas Revistas A Carta (editada em João Pessoa) e Algomais (no Recife).