
Miguel Lucena
Quando penso no significado da palavra “trabalhador”, não vejo estatísticas, sindicatos ou slogans de campanha. Vejo meu pai, Miguel Vicente de Lucena. De enxada ao ombro ou com a velha máquina lambe-lambe a tiracolo, ele cruzava as ruas empoeiradas de Princesa como um Dom Quixote sertanejo, pronto a semear dignidade entre roçados e retratos. Fotografava batizados, casamentos, velórios e documentos — porque para ele toda vida merecia registro, todo rosto merecia ser reconhecido.
Vestia calça de brim, camisa “volta ao mundo” e chapéu de massa. Tinha pouco mais de 1,60m de altura, mas quem o visse mediando conflitos, defendendo os direitos dos trabalhadores ou levantando, com as próprias mãos, a sede do Sindicato em meio aos lajedos, via um gigante.
Presidiu o Sindicato dos Trabalhadores Rurais várias vezes. Não por vaidade, mas por missão. Transformou um terreno de pedras num oásis de cidadania: ambulatório médico, dentista, psiquiatra e solidariedade para quem mais precisava. Não havia burocracia, só cuidado.
Seu nome era sinônimo de respeito. Quando falava, calavam-se juízes, políticos e coronéis. Quando chorou a morte de Margarida Alves, sua amiga de lutas, o choro foi seco, de raiva e luto. Um ano depois, foi ele quem partiu, aos 67 anos — novo demais, cansado talvez de tanto carregar o mundo nas costas.
Hoje, no Dia do Trabalhador, ele vive em cada gesto meu, em cada palavra que escrevo. Porque me ensinou que trabalho não é só suor: é entrega, é luta, é amor.