No curto prazo, a guerra está afetando os preços de todas as classes de commodities, reduzindo o comércio internacional
José Roberto Mendonça de Barros*
Continua a guerra da Ucrânia, elevam-se a devastação e o custo humanitário. Suas consequências serão sentidas no mundo todo, agora e no médio prazo.
No curto prazo, a guerra está afetando os preços de todas as classes de commodities, reduzindo o comércio internacional, atrapalhando ainda mais a normalização das cadeias de suprimento e pressionando a inflação. E isso exige maior protagonismo da política monetária em muitos países, como os EUA e o Brasil. O crescimento global será menor.
No Brasil, muitos analistas creem que o choque de commodities será positivo para o País, pensando no que ocorreu em 2007/2010 e olhando o desempenho da B3 e a valorização do real neste início do ano.
Não creio que essa análise seja a mais adequada para nossos dias, por duas razões básicas: o efeito das commodities hoje não é linearmente positivo e o impacto do choque externo sobre a economia urbana é inequivocamente ruim.
No caso da agropecuária, o estímulo dos altos preços está sendo limitado por três fatores: a safra de verão apresentou uma perda relevante na produção, por causa de adversidades climáticas. As perdas entre soja (a mais relevante), milho da primeira safra e arroz são estimadas em 28 milhões de toneladas, mais de 10% da safra total esperada.
Em segundo lugar, a elevação do custo da ração está machucando muito a produção de proteínas, notadamente de suínos, frango, ovos e leite. Alguns produtores pequenos e médios poderão quebrar.
Finalmente, a brutal elevação do custo dos fertilizantes, em sua maior parte importados, vai levar a uma redução das margens e fazer vazar para o exterior uma parcela significativa dos ganhos de preços externos.
O impacto do choque externo na economia urbana é claríssimo: maior inflação (mitigada apenas pela volta da bandeira amarela na conta de luz), gigantesca pressão nos orçamentos familiares, com efeito negativo sobre o consumo, elevação adicional de juros, maior incerteza e menor crescimento.
Até o otimismo do governo sofreu reajuste, dado que agora o crescimento do PIB projetado é de apenas 1,5%. Se nossa economia estava voando, como afiançava o ministro da Economia, deve ser com equipamentos da Primeira Guerra Mundial.
Creio que o escancarado populismo fiscal em curso não conseguirá contrapor-se aos efeitos depressivos que vêm de fora, inclusive porque a desorganização fiscal afetará negativamente as expectativas dos agentes econômicos. Como se vê, o impacto do choque de commodities de 2022 será bem diferente daquele ocorrido no início do século.
*ECONOMISTA E SÓCICIO DA MB ASSOCIADOS
Estadão Conteúdo