Abrir mão do poder pátrio pode ser um gesto de amor
Maria José Rocha Lima
Depois de 25 anos, nosso filho, Lucas Vicente Rocha Lima de Lucena, realizou um encontro antológico com a sua mãe biológica, Sônia, e com as duas irmãs Camila e Desirée, no Santuário de Nosso Senhor do Bonfim, em Salvador, Bahia, onde vivi a infância e a adolescência.
Nada na história da gente acontece por acaso: a ermida foi erguida em 1669, em Setúbal, Portugal, e primeiramente era conhecida como “Anjo da Guarda”, mas depois passou a ser chamada de “Igreja do Senhor do Bonfim”. E a imagem do Nosso Senhor do Bonfim foi trazida em razão de uma promessa feita pelo capitão de mar e guerra da Marinha portuguesa Theodózio Rodrigues de Faria, que, durante forte tempestade, prometeu que se sobrevivesse traria para o Brasil a imagem de sua devoção.
O lugar é emblemático, por todas estas razões e por razões pessoais: eu vivi a infância e parte da adolescência morando na Colina Sagrada, Adro do Bonfim, sempre acompanhada dos queridos amigos Fátima Pimentel, Teresinha e Joãozinho Medina, a quem visitei. Teresinha e Joãozinho são filhos de Seu João Medina, que foi Ministro da Eucaristia da Igreja do Bonfim, e Dona Helena Medina, devotos de imensos corações.
O encontro reuniu pessoas e relatos eloquentes de pessoas importantes nas nossas histórias política e de vida, como a amiga irmã Maria José Lins, professora da Universidade do Estado da Bahia –UNEB – e terapeuta de família, que acompanhou tudo a distância e se impressionou com a recepção e reprocidades da mãe biológica e irmãs de Lucas. Para Lins, “era como se o lugar dele no coração daquela família tivesse permanecido preservado, quase intacto”. Ele é o único filho homem de Sônia e de Edivaldo, que morreu antes dele nascer. As irmãs conviveram com ele por um ano, eram bem maiores e cuidavam dele com muito carinho, uma vez que o pai morrera e a mãe estava incapacitada.
Assim, o reencontro revelou que abrir mão do poder pátrio pode ser um gesto de amor e a adoção um gesto de amor incondicional de quem deseja se tornar um pai e uma mãe de uma criança.
Os padrinhos de Lucas, que foram seus anjos da guarda, antes da adoção, Vladimir Organauskas e Zenaide do Nascimento, lembraram que Sônia, ao abrir mão do poder pátrio para nós, não cansava de repetir “eu quero que meu filho seja um homem de bem”. E Miguel Lucena, seu pai, lembrou que ao assinar o documento na presença do Juiz da Vara da Infância, Salomão Resedá, Sônia vaticinou: “Vai ser adotado por pessoas de bem, vai ser um príncipe e vai dormir em berço de ouro e travesseiro de penas de ganso”.
*Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi deputada de 1991 a 1999. Presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Psicanalista e dirigente da ABEPP. Membro da Organização Internacional Clube Soroptimista Internacional Brasília Sudoeste.