Ensaio clínico envolveu a população vacinada na Rússia – mais de 3 milhões de participantes – e não foi publicado em revista científica. Resultado é maior que o anunciado em estudo preliminar publicado em fevereiro na The Lancet.
Dados de um estudo do Instituto russo de pesquisa Gamaleya e o Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF) anunciados nesta segunda-feira (19) mostraram uma taxa de eficácia maior da vacina Sputnik V, de 97,6 % contra a Covid-19. Os dados ainda não foram publicados em nenhuma revista científica.
A pesquisa conduzida pelos desenvolvedores russo abrangeu 3,8 milhões de russos vacinados com a Sputnik V entre 5 de dezembro de 2020 a 31 de março de 2021, como parte do programa de vacinação em massa na Rússia.
Segundo o anúncio dos dados, a taxa de infecção a partir do 35º da data da primeira dose foi de apenas 0,027%.Não foram dados outros detalhes do estudo.
A eficácia anunciada nesta segunda-feira é maior que a de um estudo publicado em fevereiro na revista científica “The Lancet”, que apontou que a Sputnik V é 91,6% eficaz contra a doença. A eficácia contra casos moderados e graves da doença foi de 100%.
Os estudos usaram uma amostragem diferente. O publicado na The Lancet envolveu 19.866 participantes, mas o ensaio está em andamento e tem o objetivo de incluir um total de 40 mil voluntário.
Quando o estudo de uma vacina é publicado em uma revista científica, significa que os dados foram revisados e validados por outros cientistas.
Segundo o comunicado do Fundo Russo, os dados e cálculos da eficácia da vacina serão revisados por pares e publicados em uma revista médica em maio.
“Dados publicados pelo jornal médico The Lancet demonstraram a eficácia da Sputnik V em 91,6%. A análise dos dados da taxa de infecção de quase 4 milhões de pessoas vacinadas na Rússia mostra que a eficácia da vacina é ainda maior, chegando a 97,6%. Esses dados confirmam que a Sputnik V apresenta uma das melhores taxas de proteção contra o coronavírus entre todas as vacinas”, comentou o CEO do RDIF, Kirill Dmitriev.
Os pesquisadores do Gamaleya haviam sido criticados pela falta de transparência nos dados. A Rússia também recebeu críticas por ter aprovado a vacinação em massa no país ao mesmo tempo em que os testes de fase 3 ainda estavam sendo conduzidos.
Nessa etapa de ensaios, uma vacina é testada em milhares de voluntários para avaliar a sua segurança e eficácia em grande escala antes que ela seja liberada para a população em geral. A Sputnik V foi a primeira vacina a ser registrada no mundo contra a Covid-19.
Ainda sem respostas
Os imunizantes desenvolvidos contra o coronavírus até este momento têm tido como função principal impedir casos graves e mortes pela doença – e não necessariamente a sua transmissão.
Outra observação feita pelos cientistas é que ainda não é possível determinar a duração da proteção que a vacina oferece, porque os dados foram analisados cerca de 48 dias após a primeira dose.
Tecnologia
A Sputnik V usa a tecnologia de vetor viral. Nesse tipo de vacina, um outro vírus (nesse caso, o adenovírus) “leva” o material genético do coronavírus, o RNA, para dentro do nosso corpo. Mas esse adenovírus é modificado para não conseguir se replicar (reproduzir). Por isso, ele não causa doença.
No caso da Sputnik, o adenovírus que leva o coronavírus para dentro do corpo é diferente em cada dose: na primeira, é o Ad26 (mesmo da vacina da Johnson). Na segunda, é o Ad5, mais comum. Ambos são adenovírus humanos.
Os cientistas russos explicam que usar adenovírus diferentes pode ajudar a criar uma resposta imunológica mais poderosa – em comparação ao uso do mesmo vetor duas vezes –, pois diminui o risco de o sistema imunológico desenvolver resistência ao vetor inicial.
“Por isso que eles dão as duas doses com vetores diferentes – é para minimizar a resposta ao vetor. Essa abordagem da Sputnik de usar primeiro o Ad26 e depois o Ad5 é boa”, explica Maurício Nogueira.
“Como pode ser também interessante o que havia sido colocado anteriormente: uma mistura da Sputnik com Oxford pode dar um resultado também legal”, diz.
Em meados de dezembro, a AstraZeneca, que desenvolveu a vacina em parceria com a Universidade de Oxford, anunciou que testaria o seu imunizante aplicado em conjunto com a Sputnik V. A vacina de Oxford também é de vetor viral – só que, diferente da russa, usa adenovírus de chimpanzé como vetor (que também não causa doença). Além disso, os vetores usados na primeira e na segunda dose são iguais.
No mês passado, a farmacêutica russa R-Pharm anunciou que os testes combinados têm previsão de começar este mês.