Maria José Rocha Lima*
Este ano cumpriu o importante papel, pelo menos no discurso, de ensinar sobre o valor da convivência social. Descobrimos a falta do abracinho, do beijinho, do viver em companhia de outro ou outros. Fez falta a preparação, a formação para a coexistência pacífica e harmoniosa de grupos humanos num mesmo espaço.
Certa vez ouvi de um professor de antropologia que a última coisa que alguém que vivesse mergulhada na água descobriria seria a água. E para que esta pessoa, que vivesse mergulhada na água, a descobrisse, seria necessário que ela emergisse, saísse da água, conhecesse a superfície da água, para descobri-la. A falta da convivência foi a nossa emersão.
A educação para a convivência social fez falta, muita falta. Quem não aprende no amor, aprende na dor. Lamentavelmente a convivência social não se ensina na escola.
O filósofo Clóvis Barros Filho, em entrevista na CNN, defendeu, como eu, o ensino da convivência nas escolas. Para ele, “não temos professores que nos ensinem a convivência”. E continuou: “Precisamos saber que tipo de aluno queremos formar”.
É preciso que os alunos limpem, zelem pela escola onde estudam. Todos cuidarão do patrimônio público. A escola é de todos.
Penso que este ano tão complicado, ano de confinamento, de muito medo da morte, ano de isolamento social, nos fez emergir, pelo menos em tese, na marcha insensata do individualismo, do egoísmo, do cada um por si. Nunca se discursou tanto sobre convivência social, solidariedade, resiliência, generosidade, otimismo. Só descobrir a importância do outro, descobrir o valor do abraço, do beijo, da doação não calculada… Quem sabe fará, pelo menos, aumentar um pouco o grupo dos amigos desinteressados.
Claro que existe na sociedade um grupo de pessoas que perseveram no seu ser. Este grupo acredita que todas as pessoas fazem tudo calculado e os que pertencem a este grupo racionalizam exageradamente. E há os altruístas radicais que estão convencidos de que o eu nada vale, e só o que vale é o outro. Sobre estes últimos temos exemplos na história, tivemos Sócrates, que não fugiu ante a sentença, para não dar o mau exemplo aos seus discípulos.
E Jesus Cristo, o maior exemplo de generosidade da história da humanidade.
Claro que solidariedade é um conceito social, mas há necessidade da generosidade, da resiliência e da sabedoria. A generosidade é incondicional, a exemplo do que oferecemos aos nossos filhos, que não é solidariedade. A resiliência é a capacidade de resistir, de suportar a tristeza, as incertezas, e parece ter relação com alguma disposição genética. Já a sabedoria é pensar bem a vida, refletir e ter na hora de viver uma coerência.
Ensinar a convivência social é a maior lição da pandemia. Agir pela inteligência, pensando sobre cada ato, antes de realizá-lo, ao invés de promover o que há de animal em si, deixando-o no comando, deixando que as paixões ditem as escolhas. Agir com calma, com autodeterminação, disciplina e sabedoria, como manda minha mãe, Dona Teresinha.
*Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Dirigente da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise.