O ex-governador do Ceará, ex-ministro e ex-candidato à Presidência da República Ciro Gomes (PDT-CE) não esconde sua pretensão de estar na corrida presidencial em 2022. Terceiro colocado em 2018 — atrás apenas de Jair Bolsonaro (sem partido) e Fernando Haddad (PT) — o político cearense acredita ter chances ao se apresentar como “político experiente” em oposição àqueles que pregam a “nova política”.
Essa experiência, porém, difere daquela que ele atribui ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em sua avaliação, o petista — de quem já foi aliado — é o homem que mais conhece o Brasil. No entanto, após a perda do poder, Lula teria cedido ao “ódio” e corrompido a sua própria alma.
“Ele se corrompeu de alma. Ele perdeu a noção do nacional, do popular e, com o projeto de poder dele e do grupinho dele em cima de qualquer valor, é muito motivado pelo ódio, pelo fígado”, disse Ciro em entrevista ao Metrópoles realizada nesta terça-feira (23/06).
Ao falar do governo Bolsonaro — a quem Ciro chama de político da “categoria bandido” — ele vislumbra três crises ocorrendo simultaneamente. Uma na área de saúde, com a pandemia do coronavírus. A outra, na economia, com a queda na geração de riquezas e a perda de milhões de postos de trabalho. Por último, há uma crise de natureza política provocada, na sua avaliação, pelo comportamento do presidente da República.
Como componente da crise política, Ciro avalia que a reação de Bolsonaro à gravidade do coronavírus somada ao seu flerte com manifestantes que pedem um golpe de estado a partir de uma intervenção militar são determinantes para definir o quadro de deterioração que o governo estaria passando junto à opinião pública e aos políticos eleitos.
“As simulações da comunidade científica inteira apontam que nós podemos chegar entre 80 mil e 120 mil brasileiros mortos. Isso é uma tragédia sem precedentes e o Brasil tem um presidente negacionista da ciência, que fica prescrevendo, como um charlatão, remédios na televisão, que não têm base científica. Três vezes troca o Ministério da Saúde, ocupa (os cargos) com generais e militares, nenhum deles com qualquer experiência com a saúde pública”.
Questionado sobre como reagiria se estivesse à frente do governo, Ciro disse que teria decretado um lockdown severo desde o primeiro momento e abriria linhas de crédito e pagamentos via cartão de débito – “para evitar aglomerações” – a quem perdesse o emprego. Com isso, acredita, evitaria a perda de vidas e conseguiria manter o fôlego da economia. Na sua avaliação, Bolsonaro tem uma das piores reações de todo o planeta ao momento.
“O Brasil está destruindo entre 1 milhão e 1,5 milhão de empregos por mês”, destacou. “Eu, que estou aqui embaixo, vejo que o dinheiro não chegou por absoluta incompetência do governo do senhor Jair Messias Bolsonaro”, disse Ciro. “E, para não faltar nada, Bolsonaro introduziu nessa gravíssima crise econômica, sem precedentes, e de saúde, uma crise politica”, prosseguiu Ciro.
“Espírito corrompido”
Ao longo de quase uma hora de conversa, Ciro teceu críticas tanto a Bolsonaro quanto a Lula. Ele rechaçou, porém, as comparações que alguns movimentos e políticos fazem entre os dois.
“Há uma injustiça e uma confusão nisso daí. Não é possível comparar um picareta de quinta categoria como o Bolsonaro, um corrupto, um cara que não tem empatia, um cara que não dá uma palavra de luto de condolência a 51 mil compatriotas que morreram, com o Lula, que deu a vida inteira a valores que são outros”, defendeu Ciro.
“Uma coisa é o Lula, outra é o Bolsonaro. Bolsonaro está na categoria bandido para mim. O Lula está na categoria de uma pessoa que se corrompeu no espírito”, prosseguiu o político. “Ele corrompeu a alma”, enfatizou.
“Verão passado”
Ciro tem um discurso otimista quanto ao que ele chamou de “reação” aos ataques que Jair Bolsonaro estaria fazendo contra a democracia. Na sua avaliação, as operações da Polícia Federal e o inquérito das fake news, no STF, seriam uma demonstração de que “as instituições estão funcionando”. Dessa forma, qualquer sanha golpista seria interrompida.
“Eu diria que o Bolsonaro não tinha forças para promover um golpe — embora o querer dele seja esse — e que ele estava testando os limites dos homens e mulheres da República. Só que ele se deu muito mal nesses testes porque eu vejo as instituições funcionando, operando, e ele agora está em uma clara defensiva, especialmente porque ele sabe o que ele fez no verão passado”, comentou.
“E o que ele fez no verão passado? É que ele é um deputado medíocre, ligado ao que há de mais podre na vida pública brasileira, especialmente no Rio de Janeiro. Ele é ligado às milícias e ele ensinou, ele corrompeu os filhos nesta coisa do peculato vulgar de ter funcionário fantasma, assinando recibo para eles botarem o dinheiro no bolso”, completou.
Parceria com governadores e prefeitos
Se estivesse na presidência, Ciro tentaria uma parceria com os governadores e prefeitos. Bolsonaro protagonizou embates com chefes do executivo estadual a respeito dos caminhos a serem adotados contra a pandemia.
“Eu convocaria uma reunião de todos os governadores, determinaria junto com eles um lockdown severo, isolamento social radical e estabeleceria uma ajuda que seria mandada de uma vez por um cartão de débito que seria enviado pelos Correios no valor de R$ 1.800″, disse.
“Antipetismo e fake news”
Ciro avaliou ainda que a ascensão de Bolsonaro ocorreu em um ambiente de antipetismo crescente como resultado dos desmandos do partido no poder. Somado a isso, ele vê uma influência norte-americana no cenário local.
“A eleição de 2018 foi de um antipetismo odiento, raivoso de milhões de pessoas que foram enganadas, fraudadas e que sofreram estelionato eleitoral. Em cima disso desce no Brasil um cidadão chamando Steve Bannon”, acusou Ciro, referindo-se ao assessor político de Donald Trump, que serviu como assistente do presidente e estrategista-chefe da Casa Branca.
“Moro monotema”
Ao falar sobre a próxima eleição para a Presidência da República, Ciro enfatizou que quer colocar o seu nome como postulante e disse acreditar que a direita deve testar, nos próximos meses, a aceitação de três candidaturas: Sergio Moro, Luciano Huck e João Doria.
“Moro é o monotema da corrupção. Ninguém perguntou ao Moro o que ele acha da questão da saúde e o que ele estava fazendo no governo Bolsonaro enquanto os filhos do Bolsonaro estavam escondendo o Queiroz. O Moro estava lá. Então, vamos empacotar o homem da corrupção. O juiz que condena um politico e vai ser ministro do outro político e ainda vem falar em decência. Só no país do Bolsonaro a gente pode acreditar nisso”, criticou.
Ciro criticou, ainda, a ida do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub para os Estados Unidos antes de deixar o governo. Na sua avaliação, houve crime por parte do presidente da República na publicação de sua exoneração e posterior reformulação da edição anterior.
*Entrevista concedida ao Metrópoles