*Maria José Rocha Lima
Hoje vi no noticiário da televisão seis irmãos, bem crescidinhos, que se encontravam em abrigo. A reportagem chamou a atenção para a dificuldade da adoção de crianças depois dos dois anos e mais difícil a adoção de irmãos. Um gesto nobre e corajoso do professor que adotou os seis irmãos e da sua namorada que aceitou. Chama-nos a atenção que fenômenos como abandono maus-tratos e negligência por parte dos pais têm se tornado rotineiros no noticiário. Portanto, cabe a nós um trabalho permanente de reflexão sobre a responsabilidade da maternidade e da paternidade para a promoção da igualdade; da humanização e da paz. A primeira responsabilidade de um pai e de uma mãe é ter o seu filho por escolha. Nascer não pode ser um mero acidente biológico. E se não for por escolha tudo começa errado! Muitas pessoas duvidam que em pleno século XXI com tantos métodos contraceptivos, ainda haja a ‘gravidez indesejada’, mas um estudo brasileiro mostra que para muitos casais a gravidez não foi evento planejado. De acordo com o site Trocando Fraldas, 11% de pais de filhos indesejados não assumiram a criança. Na região Centro-Oeste, a maioria das mulheres afirma que a gravidez não planejada é resultado da falha do método da pílula de contracepção, em 24% dos casos, enquanto 5% não sabe identificar com certeza a razão da gestação. O estudo mostra que 76% dos bebês que não foram planejados chegam a nascer enquanto o restante das gestações não é concluído seja por abortos espontâneos, não espontâneos ou outras complicações. A pesquisa revela que de 12.000 mulheres entrevistadas de todo o Brasil, 56% engravidou pelo menos uma vez sem planejamento. Todos os dias estamos a escutar histórias muito tristes de abandono e demissão dos pais das suas responsabilidades. A negligência e o abandono, definidos pela omissão de cuidados e de atendimento às necessidades físicas e emocionais da criança, juntamente com outros maus-tratos, vêm alarmando diversos setores da sociedade por seus crescentes índices e pelas lesões e traumas decorrentes da negligência, tanto na esfera física (desde pequenas cicatrizes até danos cerebrais permanentes, inclusive a morte), como nas esferas psicológicas (baixa auto-estima, desordens psíquicas graves), também na esfera cognitiva (deficiência de atenção, distúrbios de aprendizado, distúrbios orgânicos cerebrais graves), emocional e comportamental (dificuldade de estabelecer relações interpessoais, comportamentos suicidas e criminosos) que podem se manifestar a curto, médio e longo prazo. Há que se considerar, ainda neste contexto, não apenas a negligência praticada no âmbito familiar, mas também a negligência estrutural. Ser pai e mãe de verdade não é só ter um filho, não. Isso poderia ser denominado acidente biológico, como ocorre com os demais animais. Transformar este acontecimento em algo significativo exige consciência, compromisso, responsabilidade e amor. Cabe a nós um trabalho permanente de reflexão sobre a responsabilidade da maternidade e da paternidade para promover uma educação para a humanização e para a paz.
Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi deputada estadual de 1991 a 1999. É fundadora da Casa da Educação Anísio Teixeira