Nomeação partiu do atual subcontrolador do GDF; ele também é vice-presidente da entidade que representa servidores do Legislativo e do TCU. Controladoria nega irregularidade.
Responsável pela área de transparência do governo do Distrito Federal, o subcontrolador-geral Paulo Wanderson Martins nomeou como coordenador de Combate à Corrupção um colega que trabalhava com ele em uma entidade sindical de Brasília. O ex-motorista Daniel Alves Lima agora recebe como assessor especial de Paulo Wanderson na Controladoria-Geral do DF (CGDF).
De 2017 até este ano, Lima dirigia para o Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do TCU (Sindilegis). Já Paulo Wanderson é vice-presidente da entidade desde 2017, em um mandato de quatro anos – e, mesmo com o cargo no GDF, ele continua à frente do sindicato.
O ex-motorista começou a trabalhar na Controladoria no dia 24 de janeiro, em um cargo que prevê salário de R$ 5.855,82 por mês.
Procurado, o Sindilegis não quis revelar quanto o ex-funcionário ganhava alegando questões legais. Informou apenas que Lima ocupou a função de motorista por um ano e meio e o trabalho dele envolvia “prestar suporte nas demandas logísticas administrativas e de apoio institucional à diretoria e à vice-presidência”.
“O referido ex-empregado era detentor de CNH categoria AD, adequada ao exercício da função para a qual foi contratado.”
Este tipo de habilitação permite dirigir carro e também autoriza a transportar mais de oito passageiros em veículos como ônibus ou vans.
Na função atual, Daniel Alves Lima é pago para “examinar, desenvolver e elaborar estudos, projetos e atos normativos” e “emitir despachos, pareceres, notas técnicas ou informações para instrução de processos”.
Outro lado
O G1 tentou falar com Daniel Lima, mas a assessoria da CGDF respondeu por ele. Informou que o ex-motorista é formado em direito, bilíngue e “possui experiência como auxiliar de consultoria legislativa, conteudista, supervisor e responsável por atendimento a corpo diplomático”.
Segundo o subcontrolador-geral Paulo Wanderson, o ex-motorista foi nomeado “porque apresenta competência técnica ao exercício do cargo” e se formou em direito em 2005.
“Não há nenhuma ligação quanto ao fato de ele ter sido motorista do Sindicato, se é que isso pode estar sendo cogitado. O fato de ele ser ter sido motorista o desqualifica? Há alguma irregularidade na nomeação dele que não identificamos?”, questionou Paulo Wanderson.
Trecho do currículo de Daniel Alves Lima — Foto: Reprodução
Palavra de especialista
Para o especialista em transparência Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, este não é o tipo ideal de nomeação. “Mesmo para uma pessoa formada em direito ou administração, ainda que possa ter requisito técnico, o desejável é que tenha competência. Porque os assuntos, como a Lei de Acesso à Informação ou a Lei de Responsabilidade Fiscal, são áridos e há uma cobrança cada vez maior dos brasileiros”, explicou.
“O desejável é que sejam indicadas pessoas que já lidem com esse tema, que tenham algum tipo de especialização para que desenvolvam um bom trabalho.”
Para Gil Castello Branco, “uma pessoa que não tem experiência vai ter ali um cargo comissionado e até aprender com os subordinados”. Mas para o especialista, a grande questão é a descontinuidade das ações desenvolvidas.
“Esse é o problema do setor público: pessoas que não têm nenhuma afinidade com o cargo e caem de paraquedas sem deixar nenhum legado para a administração pública.”
Subcontrolador investigado
O subcontrolador Paulo Wanderson com o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB) — Foto: Reprodução/Facebook
O G1 mostrou em fevereiro que o subcontrolador-geral Paulo Wanderson Martins é investigado pelo Tribunal de Contas da União(TCU) e pelo Ministério Público Federal porque teria omitido que era réu na Justiça por peculato – desvio de dinheiro – para conseguir tomar posse como auditor de carreira.
Segundo a denúncia, Paulo Wanderson sonegou, em 2014, a informação de que tinha pendências judiciais, fato que pode colocar em xeque o cargo dele no TCU. Ao G1, o subcontrolador negou irregularidades (veja o que ele diz ao fim deste texto).
Relembre
Paulo Wanderson foi acusado de fazer compras pessoais para ele e a mulher usando dados do cartão de crédito de clientes do Banco do Brasil. As aquisições foram feitas pela internet entre dezembro de 2008 e fevereiro de 2009 – época em que ele era funcionário do banco em Cáceres, interior de Mato Grosso.
Em meio aos itens adquiridos estão passagens de avião, ingresso para evento, máquina de lavar, geladeira, televisão e aparelho de ar-condicionado. O episódio foi investigado pela Polícia Federal e virou uma denúncia formal do Ministério Público do estado.
Apurações contra o subcontrolador Paulo Wanderson — Foto: Reprodução/TV Globo
As investigações apontaram que ele fez três vítimas: um policial federal, uma servidora do Tribunal Regional do Trabalho e uma advogada. No total, o prejuízo financeiro chega a R$ 10.595.
Uma dessas vítimas relatou ter deixado o cartão cair na agência por engano e que só depois do réveillon percebeu na fatura as compras feitas em nome dela.
O processo contra ele na Justiça não chegou ao fim porque prescreveu. Segundo o Ministério Público, “houve manobras protelatórias para adiar um desfecho”.
Saída da CGDF
Após a reportagem do G1, o ministro-substituto André Luis de Carvalho, do TCU, pediu para que Paulo Wanderson saia da CGDF e volte ao tribunal para que possa responder ao processo administrativo movido contra ele.
A Corte tinha cedido o servidor para o governo do DF para que assumisse o cargo de subcontrolador.
Segundo o TCU, o pedido do ministro André Luis de Carvalho ainda está em análise pela Presidência da Corte. Não há prazo para decisão.
O que diz Paulo Wanderson?
“Depois da reportagem, provoquei formalmente o Tribunal, e a Comissão de Ética do TCU se decidiu, na semana passada (19/3), na mesma linha da decisão do Presidente, concluindo, de forma unânime, que ‘não se vislumbra conflito de interesse, desvio ético ou qualquer outra situação que possa atrair a competência desta Comissão’.”
A Comissão de Ética, no entanto, tinha dito que não tinha competência para julgar o caso porque não envolve algum ato de Paulo Wanderson no exercício da função, e sim algo anterior – a nomeação dele. Por isso, o assunto foi remetido para a Presidência do TCU, que ainda não tem prazo para dar a palavra final.
Sobre a denúncia de peculato, Paulo Wanderson afirmou que o processo que tramitou na Justiça de Mato Grosso, há 10 anos, foi encerrado e arquivado definitivamente em 2017, após parecer favorável do próprio Ministério Público do estado, sem ocasionar qualquer tipo de condenação.
Fonte G1