Obra custou R$ 1 bilhão, e contrato é avaliado em R$ 6 bilhões; consórcio quer entregar estruturas e dívida. Complexo foi ‘inaugurado’ em 2014, mas segue vazio; alvará foi trocado por caixa 2, diz delator
Passados mais de três anos desde a “inauguração” da estrutura (veja detalhes abaixo), o governo do Distrito Federal ainda não encontrou uma saída para administrar o Centro Administrativo construído em Taguatinga. Enquanto as negociações não avançam, o Palácio do Buriti e o consórcio responsável decidiram adotar sigilo absoluto sobre o tema.
Ao longo desta semana, o portal G1 pediu atualizações sobre o caso à Secretaria de Comunicação do DF e à assessoria do consórcio Centrad, formado pela Odebrecht e pela Via Engenharia. Em resposta, a reportagem recebeu uma nota dizendo que “o governo não se pronuncia sobre o assunto”, e posição semelhante das empresas.
O G1 insistiu com os dois lados – ponderando, inclusive, que a legislação brasileira só autoriza sigilo sobre informações de governo que prejudiquem as relações internacionais do país, a soberania nacional, a segurança de autoridades e a estabilidade financeira do país, ou casos tão excepcionais quanto estes.
Contrato bilionário
O contrato da Secretaria de Planejamento do DF com o Centro Administrativo não coloca a soberania nacional em risco, mas é de interesse da população do DF porque envolve grandes cifras de dinheiro público. O valor global da Parceria Público-Privada (PPP) é estimado em R$ 6 bilhões.
Esse valor deveria ser repassado pelo governo ao Centrad como pagamento pela gestão do complexo de prédios em Taguatinga, em parcelas mensais de R$ 12,6 milhões ao longo de 22 anos. O Centrad diz ter investido R$ 1 bilhão no local, somando investimento próprio e empréstimos captados em bancos.
Até esta quarta-feira (17), nenhuma parcela havia sido repassada pelo Buriti ao Centrad. Em 2016, o consórcio propôs uma espécie de rescisão: o governo assumiria a gestão e os edifícios do Centro Administrativo – e levaria, consigo, toda a dívida bilionária gerada pela construção.
Contrato questionado
Em julho, a Secretaria de Planejamento e a Controladoria-Geral do DF criaram uma comissão para analisar a possibilidade de anular o contrato firmado com o consórcio. O grupo tinha prazo de 90 dias, prorrogáveis por mais 90 dias, para apresentar conclusão.
Em 22 de dezembro, o mesmo grupo foi “reconduzido” à comissão, com novo prazo de até 180 dias. Com isso, agora, o grupo teria até 19 de junho deste ano para decidir se pede, ou não, a anulação judicial da PPP.
A hipótese foi levantada após delação do ex-executivo da Odebrecht João Antônio Pacífico Ferreira e ao fim de uma auditoria realizada pela Controladoria-Geral do DF. De acordo com depoimento de Pacífico, as negociações para a construção do Centro Administrativo, entre 2007 e 2014, foram marcadas por “acordos de mercado” na fase de licitação e repasses ao caixa dois de campanhas eleitorais.
Em junho, o chefe da Casa Civil do DF, Sérgio Sampaio, disse entender que, se houvesse a invalidação do contrato, o consórcio Centrad “não teria mais direito a receber pela construção”, e poderia até ser obrigado a indenizar o governo local.
Contrato suspenso
O projeto do Centro Administrativo está 97% concluído, mas as obras foram interrompidas em 2014. Os valores de R$ 1 bilhão investidos até agora, e de R$ 6 bilhões no total, não incluem obras “complementares”, como mudanças nas vias da região para absorver os impactos de trânsito.
O espaço chegou a ser inaugurado pelo ex-governador Agnelo Queiroz no último dia de mandato, em 31 de dezembro de 2014. Na semana posterior, o então recém-empossado Rodrigo Rollemberg afirmou que os prédios estavam incompletos – sem mobília, internet e telefone, por exemplo – e que só faria a transferência quando houvesse condições.
O novo Centro Administrativo é composto por 16 prédios, espalhados em uma área total de 180 mil metros quadrados entre Taguatinga e Ceilândia. Em 2014, o GDF estimava economizar cerca de R$ 10 milhões mensais aos cofres públicos com a migração de órgãos que atualmente pagam aluguel em prédios no Plano Piloto.
O complexo também inclui 3 mil vagas de estacionamento, um bicicletário, e áreas livres para construção de estruturas como restaurantes, agências bancárias e um supermercado.
Em entrevista ao portal G1 em novembro de 2016, a secretária de Planejamento do DF, Leany Lemos, disse que a intenção do Buriti era de transferir parte da estrutura para o Centro Administrativo – com ou sem Centrad. “Não pode abandonar, tem um patrimônio imenso em jogo, tem vantagens e desvantagens”, declarou, naquele momento.