
Miguel Lucena
Há quem atravesse o ano contando perdas. Outros fazem balanço de ganhos. Eu prefiro atravessar o tempo como ensinou João Paraibano, esse mestre da palavra que brota do chão rachado do Sertão: fazendo da esperança uma arma para sobreviver.
O ano termina cansado. Carrega crises, desalentos, promessas quebradas e sonhos amassados no bolso. Mas, ainda assim, a gente insiste. Planta até o desengano, como quem sabe que nem toda semente nasce flor — algumas viram lição. E mesmo quando a terra parece seca demais, há quem regue com as próprias lágrimas, num gesto silencioso de resistência.
Esperançar, no fundo, é um ato de teimosia poética. É acreditar que a ilusão — essa palavra tão maltratada — não precisa morrer, desde que caminhe de mãos dadas com a lucidez. Não é ingenuidade: é escolha. Escolha de não virar pedra por dentro.
No fim do ano, enquanto o calendário se despede, que cada um faça como o poeta: arme-se de esperança, mesmo ferido; plante, mesmo cansado; regue, mesmo chorando. Porque sobreviver, às vezes, já é uma forma de vitória.


