Coluna revelou que Câmara pagou mais de R$ 807,5 mil em salários à Gabriela Batista Pagidis, funcionária fantasma no gabinete de Hugo Motta

O Ministério Público Federal (MPF) aumentou a pressão em torno do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), acusado de nomear a fisioterapeuta Gabriela Batista Pagidis como funcionária fantasma. Documentos obtidos pela coluna apontam que o órgão vê “eventual dano ao erário” na contratação dela, lotada no gabinete por 8 anos.
Como mostrou a coluna em julho, a Câmara desembolsou mais de R$ 807,5 mil em salários para a ex-secretária parlamentar de 30 anos, de junho de 2017 a julho de 2025. A reportagem levou o advogado Rafael Severino Gama a ingressar com ação popular no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) contra Hugo Motta e a União.
Os pedidos dele à Justiça incluem reconhecer a ilegalidade da contratação, anular a contratação por ser funcionária fantasma e devolver os valores aos cofres públicos. Na visão do MPF, a exoneração de Gabriela Pagidis em julho passado não sanou a questão.
“Embora o ato tenha sido revogado por meio da exoneração da ex-servidora, produziu efeitos jurídicos durante todo o período que esteve em vigor, devendo ser ressarcido eventual dano ao erário ocorrido na hipótese de comprovação da sua nulidade e lesividade”, escreveu o procurador da República Harold Hoppe, em 27 de outubro.
O MPF se manifestou a favor da continuidade do processo, ajuizado em 18 de julho e atualmente em fase de produção de provas. Além disso, o órgão barrou os argumentos de defesa de Hugo Motta e da União.
“No caso em concreto, o ato praticado deve ser declarado nulo desde seu nascedouro, no caso de comprovação do desvio da finalidade pública em prejuízo ao erário, razão pelo (sic) qual está presente o interesse de agir da parte autora”, prosseguiu.
A Advocacia-Geral da União (AGU) sustentou que a ação deveria ser extinta ainda no início. Na versão do órgão, o autor não deveria ter interesse em entrar com o processo, uma vez que Gabriela Pagidis já havia sido exonerada. Também afirmou que Rafael Gama não apresentou provas de que houve dano aos cofres públicos.
“O que caracteriza o interesse processual ou interesse de agir é, em síntese, o ‘binômio necessidade-adequação; necessidade concreta da atividade jurisdicional e adequação de provimento e procedimento desejados’. O prejuízo jurídico, que confere interesse de agir, deve ser de natureza objetiva e prática, e não meramente subjetiva e hipotética. […] Partindo dessas premissas e considerando que a ex-servidora, cujo ato de nomeação se pretende anular, já foi exonerada em 14/7/2025, ou seja, antes do ajuizamento da ação, a presente ação merece ser extinta sem o julgamento do mérito”, afirmou o advogado da União Sergio Guizzo Dri, em 6 de agosto.
Ainda segundo a AGU, trabalhar na iniciativa privada enquanto atua como secretária parlamentar é possível com a devida flexibilização da Casa, e sem violação da moralidade. Gabriela Pagidis era fisioterapeuta em duas clínicas de Brasília. Já a Advocacia-Geral da Câmara, responsável pela defesa do deputado federal, repetiu a linha de raciocínio.
“Observadas as proibições aplicáveis a todos os servidores públicos da União (art. 117 da Lei n. 8.112/1990), o secretário parlamentar pode trabalhar em outras atividades na iniciativa privada, desde que cumpra a regular jornada de trabalho perante a Câmara dos Deputados”, endossou o advogado da Casa Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, em 3 de setembro.
O processo não apresenta depoimentos formais de Hugo Motta ou de Gabriela Pagidis, mas menciona que a fisioterapeuta compareceu espontaneamente ao MPF com uma procuração.
O jornal Folha de S.Paulo também revelou a existência de outros funcionários fantasmas no gabinete dele, como Ary Gustavo Soares, caseiro de uma fazenda do deputado em Patos (PB). Além dele, constam a médica Louise Lacerda, filha do ex-vereador de Conceição (PB) Marcílio Lacerda (Republicanos), que cursava faculdade e estava nomeada, e a assistente social Monique Agra Magno, que tinha um segundo emprego na Prefeitura de João Pessoa. A ação popular, no entanto, trata apenas de Gabriela Pagidis.
Procurados pela coluna, Hugo Motta e AGU não se pronunciaram até a publicação desta reportagem.
Chefe de gabinete de Hugo Motta tinha poderes para movimentar contas e salários
Em 1º de setembro, Rafael Gama acrescentou aos autos outra reportagem publicada pela coluna que revelou que a chefe de gabinete de Hugo Motta, Ivanadja Velloso Meira Lima, mantém poderes “amplos e ilimitados” para movimentar contas bancárias de 10 assessores e ex-assessores do deputado.
Oito procurações obtidas pela coluna permitem, explicitamente, “receber salários” – dois funcionários que assinaram esse documento seguem no gabinete de Hugo Motta. No total, essas pessoas acumularam mais de R$ 4 milhões em remunerações, considerando apenas o período em que estiveram lotadas no gabinete do deputado paraibano.
A defesa de Hugo Motta reiterou os argumentos e disse que o advogado buscava “promoção pessoal” e obter honorários advocatícios ao ingressar com o caso. Rafael Gama rebateu que a exoneração de Gabriela Pagidis não a isenta do ressarcimento salarial. Ainda não há data prevista para o julgamento.
A Procuradoria da República no Distrito Federal (PRDF) também abriu investigação preliminar sobre a suspeita de rachadinha no gabinete de Motta.
Quem é Gabriela Pagidis, ex-funcionária fantasma de Hugo Motta
Gabriela se formou em fisioterapia na Universidade de Brasília (UnB), campus Ceilândia, em 2019. A coluna acompanhou o dia a dia dela antes da demissão e confirmou que a então secretária parlamentar também trabalhava no Instituto Costa Saúde, na Asa Norte, às segundas e quartas-feiras, e no Centro Clínico Bandeirantes, no Núcleo Bandeirante, às terças e quintas à tarde.
A jovem ingressou na faculdade em 2014. Como o curso ocorre em período integral e diurno, não seria possível conciliar a graduação com as atividades de secretária parlamentar. A funcionária fantasma também fez duas pós-graduações: uma em fisioterapia cardiorrespiratória, também na UnB, e outra em fisioterapia pélvica, no Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).
Ela não foi a única integrante da família Pagidis a integrar o gabinete de Hugo Motta. A coluna mostrou que o deputado empregou quatro parentes dela: a mãe, Athina Batista Pagidis; a irmã, Barbara Pagidis Alexopoulos; a tia Adriana Batista Pagidis França; e o primo Felipe Pagidis França. Levantamento da coluna mostra que o clã obteve mais de R$ 2,8 milhões em salários da Câmara.
Veja o total de salários:
- Adriana Pagidis: R$ 244.858,89;
- Athina Pagidis: R$ 919.917,83;
- Barbara Pagidis: R$ 710.579,65;
- Felipe Pagidis: R$ 94.702,19.
Arte Metrópoles
Antes de constar como secretária parlamentar de Hugo Motta, Gabriela foi nomeada em 5 de fevereiro de 2014, na mesma função, no gabinete do ex-deputado federal Wilson Filho, hoje secretário de Educação da Paraíba e aliado do presidente da Câmara. Se somar ambos os períodos como funcionária fantasma, a remuneração supera R$ 890,5 mil, sem correção da inflação. (Metrópoles)

