quarta-feira, 30/07/25
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Reforma do Judiciário: Câmara dos Deputados analisa 64 propostas após duas décadas sem mudanças estruturais

 

 

 

Sistema de Justiça brasileiro permanece há 20 anos praticamente inalterado, o que motiva uma série de propostas em tramitação no Congresso

Plenário da Câmara dos Deputados. Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

 

Ao menos 64 Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que visam alterar o funcionamento do Poder Judiciário estão atualmente com a tramitação paralisada na Câmara dos Deputados, segundo levantamento da CNN.

As propostas envolvem mudanças na estrutura, funcionamento, composição e controle externo do Poder Judiciário, além de alterações em órgãos diretamente relacionados, como o Ministério Público e os Tribunais de Contas.

O Supremo Tribunal Federal (STF) é o foco principal de ao menos 15 dessas PECs, que propõem mudanças nos critérios de escolha, nomeação, tempo de mandato ou funcionamento dos ministros da Corte. No entanto, nenhuma dessas propostas traz alterações consideradas robustas ou estruturais.

A PEC mais antiga foi apresentada em 2005 pelo então deputado João Campos (PSDB-GO). O texto propõe transferir do presidente da República para o Congresso Nacional a responsabilidade pela escolha dos ministros do STF. A proposta também estabelece uma “quarentena” de quatro anos, impedindo a indicação de pessoas que tenham exercido mandato eletivo, cargo de ministro de Estado ou presidência de partido político, como forma de reduzir a influência político-partidária nas nomeações. A última movimentação do projeto ocorreu em 2023, com parecer favorável do relator Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ).

As propostas mais recentes, de 2023 e 2024, representam uma ofensiva do Congresso diante da tensão entre os Poderes. Em outubro de 2024, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou uma PEC que permite ao Congresso derrubar decisões do STF caso considere que a Corte tenha extrapolado suas atribuições jurisdicionais. Também foi aprovada outra proposta que restringe decisões monocráticas, proferidas por um único ministro.

“É isso que nós, parlamentares, temos que fazer: criar leis que enquadrem o Supremo, que façam com que ele trabalhe como um colegiado e não como 11 ministros isolados, como se tivéssemos 11 Supremos Tribunais Federais”, afirmou o senador Oriovisto Guimarães, autor de uma das propostas. Ambos os textos aguardam análise de uma comissão especial antes de seguirem ao plenário.

Outras duas PECs aprovadas na CCJ ampliam as hipóteses de crime de responsabilidade aplicáveis a ministros do STF, abrindo caminho para eventuais processos de impeachment.

Ministros do Supremo enxergam nessas propostas uma retaliação após a decisão da Corte que suspendeu a execução das emendas parlamentares por falta de transparência e rastreabilidade. Segundo alguns magistrados, tais iniciativas legislativas ameaçam a democracia.

Entre os temas recorrentes nas 64 PECs, destacam-se ainda o fim ou a limitação do foro por prerrogativa de função (com ao menos seis propostas sobre o tema), mudanças nas regras de ingresso e disciplina de juízes e membros do Ministério Público, além da reestruturação de conselhos como o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

Estagnação estrutural e última reforma

Nos últimos 20 anos, apenas em 2006 e 2020 não houve novas propostas de alteração no funcionamento do Judiciário. A última reforma significativa foi a Emenda Constitucional 45, publicada em 31 de dezembro de 2004, após 13 anos de tramitação. Essa reforma redefiniu as competências das Justiças do Trabalho e Federal, criou o CNJ e estabeleceu novas diretrizes para ingresso e promoção na magistratura.

Para a advogada Lígia Azevedo Ribeiro Sacardo, especialista em direito civil, uma nova reforma do Judiciário é necessária. “O sistema precisa encontrar alternativas para reduzir o volume de processos, desafogar os tribunais superiores e acelerar a tramitação dos casos”, afirma.

Ela aponta como pontos de melhoria a valorização da mediação e da conciliação, o fortalecimento da primeira instância, a ampliação da digitalização e o aprimoramento dos critérios de acesso aos tribunais superiores. “Qualquer proposta de reforma, no entanto, deve preservar a independência do Poder Judiciário, a segurança jurídica e os direitos fundamentais”, alerta.

Propostas da OAB-SP podem dar novo fôlego ao debate

O tema voltou ao centro do debate público após a instalação de uma comissão da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo), que tem como objetivo elaborar anteprojetos para uma eventual reforma do sistema de Justiça.

Em entrevista à CNN, o presidente da OAB-SP, Leonardo Sica, afirmou que a capacidade de autocorreção é essencial a qualquer instituição democrática. “Está na hora de discutirmos, de forma democrática, algumas autocorreções”, disse.

Para Sica, o STF ampliou excessivamente suas competências ao longo dos anos, especialmente na esfera criminal. “O STF virou um grande tribunal penal, julga muitos políticos. Isso o politiza”, explicou. Segundo ele, disputas entre Legislativo e Executivo acabam sendo decididas pela Corte, como no caso recente envolvendo o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). “Nossa Constituição prevê tanto a possibilidade dessas ações quanto regras de autocontenção”, observou.

Sica disse ainda que o ministro Edson Fachin, que assumirá a presidência do STF ainda neste ano, demonstrou abertura ao diálogo sobre a reforma. “Confiamos que os ministros estão abertos à discussão. Até porque ela será feita em tom cordial e moderado, longe dos extremos”, destacou.

A comissão da OAB-SP, criada em 23 de junho, definiu cinco eixos de trabalho: morosidade, integridade, acesso à Justiça, estabilidade e papel do STF. Após debates com a sociedade civil e especialistas, a expectativa é que um anteprojeto seja apresentado ao Congresso no início de 2026. Outra proposta será levada ao próprio Poder Judiciário.

 

 

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