
Miguel Lucena
Os especialistas de TV, de terno alinhado e sorriso de quem nunca parcelou um pastel, gostam de filosofar sobre o tal ressentimento popular. Dizem que o povo deveria aceitar, resignado, a vida dura — como se fosse fácil viver sem saber se paga a luz ou compra o gás.
Falam da inveja dos pobres, como se nos salões da elite não rolassem cotoveladas, olhares atravessados e fofocas venenosas. Aliás, a inveja do rico tem grife e sai disfarçada nas colunas sociais.
A verdade é que há muita revolta sim. De quem ralou, estudou, tentou empreender, vender almoço pra pagar o jantar — e viu o elevador social quebrado bem na sua vez de subir.
Só acha estranho o ressentimento quem nunca precisou pagar um cachorro-quente no Pix parcelado, muito menos negociar a conta da internet pra não perder o bico no aplicativo.