País já teve neste ano mais de 3 mil problemas relacionados a fenômenos naturais. Especialistas alertam que precaução é “urgente”
Ruy Conde/MDHC
A cada evento climatológico ou meteorológico de maior intensidade, os brasileiros são impactados de várias formas. Especialistas ouvidos pelo Metrópoles afirmam que o Brasil está atrasado na adaptação à mudança climática e alertam para a necessidade de trabalho para reversão do cenário.
Os números evidenciam o despreparo das cidades. O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional registrou em 2024 3.029 registros de danos e prejuízos, reconhecimento federal de situação de emergência, ações de resposta e obras de reconstrução. A dois meses e meio do fim do ano, coincidentemente o período de maior chuva no país, o número de danos já é quase o verificado em todo ano de 2023: 3.223. De 2015 para cá, o Brasil tem tido um número expressivo de registros associados ao clima.
Doutoranda em Climatologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e divulgadora científica, Karina Bruno Lima explica que não há uma “métrica” específica para classificar o que é um evento extremo.
“Pode ser em relação a limites relativos acerca de uma média, em relação a limites absolutos (acima dos quais as condições são consideradas extremas). Depende da abordagem, do estudo, às vezes do local”, explica Lima.
A especialista acrescenta que a ocorrência dos eventos climáticos extremos, somada à grande vulnerabilidade do Brasil, imprime a necessidade de planos para lidar com estas situações. “O Brasil não tem resiliência e é muito vulnerável a eventos extremos de forma geral. É urgente e necessário que tenhamos planos de adaptação climática e que eles sejam locais, adequados a cada contexto.”
A adaptação tem limite
Secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini lembra que além de se preocupar com a adaptação, é necessário reduzir ao máximo as emissões de gases de efeito estufa, que agravam a crise climática.
“Se a gente continuar poluindo o planeta tal como nós estamos fazendo, nós vamos aumentar o serviço da adaptação, até chegar uma hora que a adaptação não é mais possível.”
Astrini lembra que o trabalho a ser feito exige união para ter resultados. “O país é feito do Congresso, o país é feito do Supremo, o país é feito dos governos dos estados, (além do fedral)”, cita.
Para enfrentar a questão, o secretário do Observatório do Clima explica que é preciso olhar para as vulnerabilidades, classificá-las, entender o que e como pode ser feito e realizar os investimentos necessários.
Parte do trabalho de levantamento das vulnerabilidades já está feito. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) identificou 1.942 cidades com vulnerabilidades. O Brasil tem 5.570 cidades.
“Se a gente não fizer isso (redução das emissões e adaptação), nós vamos continuar todo ano vendo essa autoridade, seja governador, prefeito, ministro, presidente da República, todo ano, quando acontecer, infelizmente, uma nova situação de tragédia, de jalequinho da Defesa Civil, de jalequinho de não sei de onde, na frente de uma mesa, com microfone, comentando o problema”, alerta.
População afetada de Norte a Sul
Os eventos climáticos extremos estão mais frequentes e com maior intensidade, como previam os cientistas ao enxergarem o aumento da temperatura global, que desequilibra o clima do planeta.
No exemplo mais recente de como eventos meteorológicos ou climáticos afetam a vida das pessoas, mais de 2 milhões de paulistanos ficaram sem energia após um forte temporal na sexta-feira (11/10).
Na última semana, o próprio Metrópolesmostrou que um terço da rede pública estadual do Amazonas teve as aulas afetadas pela seca extrema. Rios em níveis baixos tornaram a navegação impossível em muitas localidades e, por isto, alunos ficaram sem aulas presenciais.
No Norte, o impacto da seca não alcançou apenas a educação. Os alimentos ficaram mais caros na região por causa da escassez decorrente da dificuldade de transporte. Um exemplo de manancial e situação crítica é o Rio Negro. No início deste mês, ele atingiu o menor nível em 122 anos. A cota chegou a 12,66 metros, batendo a marca de 12,7 metros, registrada em outubro de 2023.
Se no Norte a seca foi como a natureza mais interferiu no dia a dia das pessoas, no Sul, a chuva deixou um rastro de destruição e mortes. O Rio Grande do Sul teve mais de 2 milhões de pessoas impactadas e ao menos 183 vidas foram perdidas nas inundações iniciadas no fim de abril deste ano. Embora sejam situações distintas, o furacão Milton, que varreu parte da Flórida, Estados Unidos, e assustou os americanos com ventos na casa dos 190 quilômetros por hora (km/h), registrou menos de 20 mortes.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os alertas são feitos pelas autoridades a qualquer momento nos veículos de comunicação, interrompendo a programação e dando orientações precisas sobre o que fazer. No Brasil não há uma dinâmica clara de alerta nos casos de desastres, na qual as pessoas recebam informações sobre os procedimentos importantes para a segurança delas.