Dados serão analisados por investigadores em Brasília. Acidente causou a morte de 62 pessoas.
Cenipa diz que conseguiu extrair as informações das caixas-pretas de avião que caiu em Vinhedo (SP) — Foto: Reprodução EPTV
O brigadeiro Marcelo Moreno, chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), informou na manhã deste domingo (11) que o órgão conseguiu extrair todo o conteúdo das duas caixas-pretas retiradas do avião que caiu em Vinhedo (SP).
O acidente aéreo ocorreu na sexta-feira (9) e causou a morte de 62 pessoas – 58 passageiros e quatro tripulantes. Agora, o conteúdo das caixas-pretas será analisado por investigadores em Brasília.
“Os dados foram obtidos, validados, e agora aguardamos a linha de investigação de nossos investigadores, que ainda se encontram aqui comigo, regressarem a Brasília para a gente começar a trabalhar na transformação desse número enorme de dados para a informação útil para a sociedade.”
O brigadeiro informou que os dois motores do avião serão analisados em São Paulo para verificar se estavam com potência no momento do acidente.
Segundo Moreno, o relatório preliminar da investigação será apresentado em 30 dias. Acompanhe as últimas informações em tempo real.
Três representantes do Escritório de Investigações e Análises para a Segurança da Aviação Civil da França (Bureau d’Enquêtes et d’Analyses pour la Sécurité de l’Aviation Civile, BEA, em francês) chegaram na manhã deste domingo ao local do acidente aéreo que matou 62 pessoas em Vinhedo (SP).
O BEA foi acionada pelas autoridades brasileiras e deve colaborar nas investigações uma vez que a aeronave que caiu, modelo ATR-72, foi fabricada na França.
Segundo Moreno, também são esperados em Vinhedo representantes do Conselho de Segurança nos Transportes do Canadá (Transportation Safety Board, TSB, em inglês), país onde os motores da aeronave foram fabricados.
O BEA e o TSB são os órgãos francês e canadense análogos ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticios (Cenipa). Peritos dos três países devem atuar em conjunto na apuração que deve apontar as causas do acidente.
Autoridades brasileiras e francesas no local do acidente em Vinhedo — Foto: Força Aérea Brasileira
As caixas-pretas
A obtenção dos dados dos dois gravadores de voo, popularmente conhecidos como caixas-pretas, é fundamental para a investigação. Um dos equipamentos grava áudio e outro acumula dados como a altitude e a velocidade durante o voo – entenda abaixo:
- Cockpit Voice Recorder (CVR): um gravador de áudio que registra as conversas entre piloto e co-piloto, deles com os comissários de bordo e com o controle de tráfego aéreo.
- Flight data recorde (FDR): um gravador de informações e parâmetros da aeronave, como altitude, velocidade, posição das manetes, botões acionados, entre outros dados técnicos da aeronave ao longo do trajeto.
Caixa preta da aeronave que caiu em Vinhedo (SP). — Foto: Divulgação/FAB
Com esses dados da aeronave e os áudios da cabine, os investigadores podem entender a dinâmica e os fatores que podem ter contribuído para a queda do avião. Segundo a Força Aérea Brasileira (FAB), o Cenipa é referência internacional nesse tipo de investigação.
Obrigatórias na maioria dos aviões em aviões, as caixas-pretas foram inventadas, segundo a Reuters, ainda em 1950 pelo australiano David Warren. Ela mantém gravadores a fim de identificar as causas de acidentes e, assim, ajudar na prevenção deles.
As caixas-pretas não são realmente pretas. Elas são pintadas de laranja, uma cor que pode ser vista à distância, debaixo da água e no meio escombros e, desta forma, facilitar nas buscas.
Papa pediu orações para vítimas
Imagens aéreas deste domingo (11) mostram local onde avião caiu em Vinhedo e trabalho do Cenipa — Foto: Eliandro Figueira/Arquivo pessoal
O Papa Francisco pediu, durante discurso no Vaticano neste domingo (11), que os católicos rezem pelas 62 vítimas da queda de um avião em Vinhedo (SP).
“Rezemos pelas vítimas do trágico acidente aéreo ocorrido no Brasil”, afirmou o pontífice.
A citação ocorreu diante de uma multidão na Praça São Pedro. Segundo o Vaticano, havia brasileiros com bandeiras entre o grupo que acompanhou o discurso.
“O Papa Francisco expressou sua proximidade às vítimas do acidente aéreo ocorrido na tarde de sexta-feira (09/08) em Vinhedo, quando morreram os 58 passageiros e 4 tripulantes”, informou o Vaticano, em nota.
Retirada dos corpos
Acidente com avião em Vinhedo — Foto: Andre Penner/AP
Com a conclusão da retirada dos corpos das 62 vítimas da tragédia aérea e a remoção dos motores e cauda para a perícia, os próximos passos das equipes no local da queda do avião incluem o envio dos destroços ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), que prevê um relatório preliminar sobre as causas do acidente em 30 dias.
Às 9h deste domingo (11), o Corpo de Bombeiros informou que as equipes finalizaram a mobilização às 22h45 de sábado e que os escombros permaneciam no local sob responsabilidade do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).
Os bombeiros recolheram, ainda no sábado, os equipamentos logo depois de os caminhões da Voepass retirarem os motores do ATR-72-500.
Após essa etapa, a área do acidente permanece interditada até a retirada de todo material da fuselagem que se encontra no terreno da casa.
Infográfico mostra detalhes das buscas — Foto: arte g1
Um infográfico que sobrepõe imagem do local da tragédia aérea revela como o impacto deixou “um desenho da aeronave” no quintal de uma residência.
É possível observar como a aeronave, que “caiu chapada”, ficou com a área da cabine mais preservada, enquanto da metade para a cauda a destruição, por conta do incêndio, foi maior.
A aeronave caiu sem controle e girando no ar, mostram vídeos gravados do momento do acidente, num aparente estol. A análise das caixas-pretas, que incluem o gravador de voz e o gravador de dados, é fundamental para ajudar esclarecer o que ocorreu no voo 2283.
Um vídeo mostra a abertura dos equipamentos, que terão os dados extraídos no Laboratório de Leitura e Análise de Dados de Gravadores de Voo (Labdata) do Cenipa, em Brasília (DF).
‘Desenhado no chão’
As equipes que trabalham na tragédia encontraram “um desenho da aeronave no chão”. De acordo com o Corpo de Bombeiros, o avião da Voepass “caiu chapado” no terreno, apresentando a área da cabine mais preservada e com grande destruíção por conta do incêndio da metade para a cauda.
Segundo o capitão Maycon Cristo, porta-voz do Corpo de Bombeiros, as características dos destroços direcionaram os trabalhos para retirada das vítimas, começando pela cabine e terminando na cauda.
Um fator que auxiliou nos trabalhos de retirada dos corpos é o terreno onde o avião caiu. O quintal da residência possui um gramado amplo, que favorece a movimentação de peças pesadas, permitindo o acesso aos corpos.
“O avião caiu no quintal dessa residência, é um gramado amplo. A gente consegue tirar as peças mais pesadas, aquilo que tá obstruindo para chegar a vítima, consegue movimentar desse terreno, tem espaço para isso. Tira do lugar que caiu e movimenta. Criamos uma área de depósito. O terreno plano e gramado, de certo modo, facilitou nosso trabalho”, completou o capitão.
Investigação
A Polícia Civil informou no sábado que o inquérito será instaurado na delegacia de Vinhedo para apurar todos os fatos relativos ao acidente.
Delegado titular da 1ª Seccional de Campinas, José Antônio Carlos de Souza ressaltou o trabalho de compartilhamento de informações entre todas as instituições envolvidas para minimizar o sofrimento dos familiares.
Já o superintendente da Polícia Federal, Rodrigo Sanfurgo, destacou que a PF empregou seus melhores equipamentos e profissionais, e que só sairá de Vinhedo “quando os trabalhos forem finalizados”.
“Difícil falar em prazo, mas nós podemos afirmar que estamos trabalhando incansavelmente para finalizar esse trabalho e confortar todoas as famílias. Estamos entregando todo nosso esforço”, disse Sanfurgo.
Cronologia da tragédia
Ainda não se sabe o que causou o acidente, mas a queda em espiral sugere a ocorrência de um estol — que acontece quando a aeronave perde a sustentação que lhe permite voar —, segundo especialistas.
Veja, abaixo, da decolagem à queda, a cronologia do acidente da Voepass, o maior do país em número de vítimas desde 2007, quando um avião atingiu edifício em São Paulo ao tentar pousar.
Inicialmente, a Voepass noticiou que 61 pessoas tinham morrido após a queda do avião. Na manhã de sábado (10), o número de mortes subiu para 62.
- A aeronave decolou às 11h56 e o voo seguiu tranquilo até 13h20.
- O avião subiu até atingir 5 mil metros de altitude às 12h23, e seguiu nessa altura até as 13h21, quando começou a perder altitude, segundo a plataforma Flightradar.
- Nesse momento, a aeronave fez uma curva brusca.
- De acordo com a Força Aérea Brasileira (FAB), a partir das 13h21 a aeronave não respondeu às chamadas do Controle de Aproximação de São Paulo, bem como não declarou emergência ou reportou estar sob condições meteorológicas adversas.
- Às 13h22 – um minuto depois do horário do último registro – a altitude estava em 1.250 metros, uma queda de aproximadamente 4 mil metros.
- A velocidade dessa queda foi de 440 km/h.
- O Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) informou que o ‘Salvaero’ foi acionado às 13h26 e encontrou a aeronave acidentada dentro de um condomínio.
Quem são as vítimas?
A Prefeitura de Vinhedo confirmou, por volta de 15h30, que não havia sobreviventes. O governo do Paraná lamentou a morte de pelo menos oito servidores e profissionais ligados diretamente ao estado. São docentes e médicos da Unioeste, um professor da rede estadual e um funcionário da Sanepar.
O programador de 41 anos Rafael Fernando dos Santos, de Florianópolis, e a filha dele, Liz Ibba dos Santos, de 3 anos, estavam na aeronave. Segundo familiares, Rafael tinha ido a Cascavel para buscar a menina, que passaria o dia dos pais na capital de Santa Catarina.
Dentre as vítimas também estão o árbitro de judô Edilson Hobold, de 52 anos; o representante comercial Ronaldo Cavaliere, de 43 anos; além do casal formado pelo policial rodoviário federal Hiales Carpine Fodra, de 33 anos, e a fisiculturista Daniela Schulz Fodra.
As médicas residentes de oncologia clínica Arianne Albuquerque Estevan Risso e Mariana Comiran Belim também faleceram.
A comissária de bordo Rubia Silva de Lima, que morava em Bonfim Paulista, também faleceu no acidente.
Quais as hipóteses?
Ainda não se sabe o que causou o acidente, mas a queda em espiral sugere a ocorrência de um estol — que acontece quando a aeronave perde a sustentação que lhe permite voar —, segundo especialistas.
O estol é uma situação na qual a asa perde completamente a sustentação útil, o que causa a queda brusca do avião. A depender da altitude e da condição, é possível recuperar a altitude em voo.
O estol pode acontecer, por exemplo, por formação de gelo sobre as asas — e na rota dessa aeronave havia essa formação, segundo pilotos ouvidos pelo g1 e pela Globonews.
Em entrevista na noite desta sexta, a VOEPASS afirmou que os sistemas operacionais da aeronave estavam todos em funcionamento no momento da decolagem em Cascavel.
Os especialistas avaliam que a formação de gelo sobre as asas pode ser uma das hipóteses. Apesar disso, todos são unânimes em afirmar que não existe um único fator que cause um acidente e que é prematuro tirar conclusões a partir dos vídeos ou das informações divulgadas.
Já o manual do fabricante aponta risco de ATR perder sustentação e girar sob condição de gelo severo.
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o modelo que caiu em Vinhedo, ATR-72-500 da VOEPASS, é turboélice com 74 assentos. A aeronave é fabricada pela ATR, com sede na França, que é uma das maiores fabricantes de aviação do mundo. Ela estava com a documentação em dia e todos os tripulantes tinham habilitação válida.
De acordo com a fabricante, o ATR-72-500 pode voar com velocidade máxima de 511 km/h. O modelo tem 27 metros de comprimento e de envergadura, além de uma autonomia de voo de 1.324 quilômetros. O peso máximo que o avião pode carregar em serviço é de 7 mil quilos.
O avião tinha 14 anos de fabricação e era de um modelo conhecido no mundo da aviação por sua capacidade de operar em aeroportos de pista curta e de difícil acesso no Brasil e em outras partes do mundo, especialmente na Ásia, onde houve outros acidentes.
Ficha técnica do ATR-72-500 (segundo a fabricante):
- Número de assentos: 74
- Velocidade de cruzeiro: 511 km/h
- Comprimento: 27 metros
- Envergadura: 27 metros
- Altura: 7,65 metros
- Autonomia de voo: 1.324 km
Como estava o tempo no momento da queda?
Meteorologistas apontaram “áreas de instabilidade” e 35% de formação de gelo nas proximidades do local onde o avião caiu.
De acordo com o Climatempo, no momento exato em que a aeronave estava fazendo a aproximação havia um “forte vento” de cauda – o que aumenta a velocidade do avião em relação ao solo.
“Estimativas de modelos meteorológicos indicam temperaturas entre -9° a -11° C na altura correspondente a 500hPa na região de Vinhedo por volta das 13h local”, disse o órgão.
O que diz a VOEPASS?
O CEO da Voepass Linhas Aéreas, Eduardo Busch, concedeu entrevista coletiva na noite desta sexta e afirmou que os pilotos eram experientes e que os sistemas operacionais da aeronave estavam todos em funcionamento no momento da decolagem.
Mais cedo, a companhia aérea comunicou em nota que prioriza prestar irrestrita assistência às famílias das vítimas e colabora efetivamente com as autoridades para apuração das causas do acidente.
“A VOEPASS Linhas Aéreas informa que a aeronave PS-VPB, ATR-72, do voo 2283, decolou de CAC sem nenhuma restrição de voo, com todos os seus sistemas aptos para a realização da operação”.