Mas no “atual mundo multipolar, tais mecanismos não existem. O nosso mundo entrou em uma era de caos”, alertou o chefe da ONU
António Guterres, secretário-geral da ONUKena Betancur / AFP
“O mundo entrou em uma era de caos”, alertou nesta quarta-feira (7) o secretário-geral da ONU, António Guterres, denunciando as divisões sem precedentes do Conselho de Segurança, incapaz de chegar a um acordo face aos “terríveis conflitos” que se multiplicam no planeta.
“Há governos que ignoram e minam os próprios princípios do multilateralismo, sem serem responsabilizados de forma alguma. O Conselho de Segurança, principal ferramenta para a paz mundial, está estagnado devido a fissuras geopolíticas”, disse ele ao apresentar, perante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, as suas prioridades para 2024.
“Esta não é a primeira vez que o Conselho de Segurança está dividido. Mas é a pior. A disfunção atual é mais profunda e mais perigosa”, alertou Guterres, antes de lembrar que “durante a Guerra Fria, os mecanismos estabelecidos ajudaram a administrar as relações entre as superpotências”.
Mas no “atual mundo multipolar, tais mecanismos não existem. O nosso mundo entrou em uma era de caos”, alertou.
E os resultados “são evidentes: uma batalha perigosa e imprevisível com total impunidade”, disse Guterres, preocupado com uma nova proliferação nuclear e com o desenvolvimento de “novas formas de matar uns aos outros e de a humanidade se aniquilar”.
“Há tanta raiva, ódio e barulho no nosso mundo hoje! Todos os dias e na menor oportunidade há guerra, ao que parece. Conflitos terríveis que matam e mutilam civis em níveis sem precedentes. Guerras de dialética. Guerras de território. Guerras culturais”, indicou.
Do Sudão à Ucrânia, de Gaza à República Democrática do Congo, do Iêmen a Mianmar, “juntamente com a proliferação de conflitos, as necessidades humanitárias globais estão a um nível sem precedentes, mas o financiamento não está à altura”, lamentou.
Neste contexto, António Guterres apelou aos governos de todo o mundo para que aproveitem a ocasião da “Cúpula do Futuro” que acontecerá em setembro, em Nova York, durante a reunião anual da Assembleia Geral da ONU, para “modelar o multilateralismo para os próximos anos”.
Entre as mudanças “que o mundo precisa”, recordou o seu apelo a uma reforma profunda do Conselho de Segurança, do sistema financeiro internacional e ao estabelecimento de uma “ferramenta de emergência para melhorar as respostas internacionais a impactos globais complexos”, como o pandemia de covid-19.
No seu discurso, Guterres também mencionou a “guerra contra a natureza”, “uma luta de loucos”: “Estamos detonando os sistemas que nos sustentam: liberando emissões que causam a implosão do nosso clima; envenenando a terra, o mar e o ar com poluição, e dizimando a biodiversidade”.
“A crise climática continua sendo o desafio definidor do nosso tempo”, repetiu, recordando esta questão que se transformou em uma cruzada do seu mandato.
Pediu mais uma vez aos Estados que façam mais para cumprir as metas de redução das emissões de gases de efeito estufa e para alcançar os objetivos de financiamento dos países mais pobres nesta batalha. “Devemos fazer as pazes com o nosso planeta”, aconselhou.
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