Em relação à Aids, jovens representam 35,1% de adoecimento, segundo Secretaria de Saúde. Especialista afirma que nova geração não viu impacto da Aids dos anos 90.
Testes rápidos para detecção de sífilis, HIV e hepatites são alguns dos serviços oferecidos na ação social em São Luís — Foto: Foto: ASCOM ISD
Por Fernanda Bastos, g1 DF
Um total de 51,04% dos casos de infecção pelo HIV, de 2017 a 2021, ocorreram em jovens de 15 a 29 anos no Distrito Federal. Os dados, da Secretaria de Saúde do DF (SES-DF), mostram ainda que 35,1% dos casos de adoecimento por Aids estão na mesma faixa etária.
Segundo especialistas, o aumento de infecções pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) na população jovem, ocorre fatores como:
- Alta frequência em relação à prática sexual
- Elevado número de parceiros sexuais
- Dificuldade de acesso à informação adequada
- Vulnerabilidade social com falta de acesso a testagem, preservativos e insumos básicos
A médica infectologista Juliana Lapa, da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), lembra que essa nova geração não viu o impacto da AIDS dos anos 90.
“Eles não viram pessoas morrendo como antes. Essa geração já conheceu o HIV como uma doença crônica, tratável e não tem o mesmo receio das gerações anteriores”, diz a médica.
Segundo a última Pesquisa de Comportamentos, Atitudes e Práticas (PCAP), publicada pelo Ministério da Saúde (2016), 35,4% dos jovens entre 15 e 24 anos tiveram mais de dez parcerias sexuais na vida e 8,8% relatam terem tido parcerias do mesmo sexo.
“O dado expressa o risco de exposição à infecção pelo HIV e de adoecimento por Aids, que se agrega aos diversos fatores de vulnerabilidade: preconceito e discriminação das pessoas LGBTQIA+, barreiras de acesso à informação e meios de prevenção, diagnóstico e tratamento, desigualdade social e de gênero no país”, diz a secretaria.
Descoberta recente
O g1 entrevistou um jovem, que vive com HIV no DF. Ele preferiu não se identificar, mas está na faixa etária com maior incidência de novos casos, afirma que sempre cuidou da saúde e descobriu, em junho, que tem HIV.
“Fui fazer meus exames de rotina com um infectologista da rede particular para iniciar o consumo do PrEP, mas infelizmente foi tarde demais. Estava com HIV de alguma relação desprotegida que tive”, conta.
PrEP é a profilaxia pré-exposição. São antirretrovirais utilizados antes da relação sexual para reduzir o risco de adquirir a infecção pelo HIV (saiba mais abaixo).
Após descobrir que contraiu HIV, o jovem de Brasília conseguiu, por meio do SUS, pegar os remédios na rede pública para começar o tratamento. O uso correto dos antirretrovirais pode deixar a carga viral baixa ou até indetectável, e garantir qualidade de vida para os pacientes. Segundo a Secretaria de Saúde, 93% dos pacientes diagnosticados e tratados no DF apresentam carga viral indetectável.
“Está sendo um processo bem confuso, mas buscando para ficar indetectável tomando os remédios”, diz o jovem.
Ele conta que um dos maiores medos é transmitir o vírus para outra pessoa. “Não quero que pessoas se infectem como me infectei, sem saber quem foi, como, onde, me senti muito vulnerável. Tenho esperança de uma vacina do vírus para a cura dos que têm e prevenção dos que não possuem.”
HIV e Aids
O Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) é um vírus que ataca o sistema imunológico, responsável por defender o organismo de doenças. O HIV consegue alterar o DNA dos linfócitos e fazer cópias de si mesmo, se multiplicando e espalhando a infecção.
A infectologista da rede pública de Saúde do DF, Joana D’arc Gonçalves da Silva afirma que muitas pessoas quando se infectam permanecem anos sem apresentar sintomas, mesmo sem tratamento. O HIV apresenta três propriedades, de acordo com o Ministério da Saúde:
- Período de incubação prolongado antes do surgimento dos sintomas da doença;
- Infecção das células do sangue e do sistema nervoso;
- Supressão do sistema imune.
A médica infectologista Juliana Lapa destaca que após a exposição ao vírus, cerca de duas a três semanas depois, a pessoa pode desenvolver sintomas gripais como febre, dor no corpo e dor de garganta. “Esses sintomas desaparecem sozinhos e a pessoa tende a nem associar com a infecção”, diz.
No entanto, assim que o sistema imunológico fica debilitado, há o aparecimento da Aids. Ou seja, a doença aparece quando o organismo não tem mais forças para combater esses agentes externos e a pessoa começa a ficar doente mais facilmente.
“Cerca de 8 a 10 anos após (em média) que a pessoa começa a desenvolver sintomas de AIDS. Como perda de peso e propensão a ter infecções oportunistas”, diz a infectologista.
De acordo com o Boletim Epidemiológico da SES-DF, de 2017 a 2021, foram notificados 3.633 casos de infecção pelo HIV e 1.443 casos de Aids, no Distrito Federal.
Como se prevenir?
As especialistas recomendam a proteção combinada. O método consiste em:
- Uso de preservativos masculino, feminino e gel lubrificante;
- Profilaxia pré-exposição (PrEP);
- Profilaxia pós-exposição (PEP);
- Testagem regular para o HIV e outras ISTs;
- Tratar todas as pessoas vivendo com HIV/Aids;
- Prevenir a transmissão vertical (da mãe para o filho durante a gestação ou parto).
- Cuidados para evitar outras ISTs através de vacinação e tratamento de outras ISTs
Segundo a infectologista Joana D’arc Gonçalves da Silva, é preciso políticas públicas que garantam implementação de ações combinadas de prevenção. Segundo ela, programas de educação sobre saúde sexual e HIV, acesso aos serviços de saúde e garantia dos insumos como preservativos e tratamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) e políticas públicas que promovam a igualdade de gênero são essenciais
“As campanhas diminuíram e nos últimos anos houve aumento da intolerância e discriminação”, diz a médica Joana D’arc.
O preservativo, ou camisinha, utilizado para se prevenir da infecção pelo HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis é distribuído gratuitamente em qualquer serviço público de saúde e a melhor forma de evitar a transmissão. Já a PrEP e a PEP são formas de prevenção medicamentosa ao HIV para pessoas que não têm o vírus, explica a infectologista Juliana Lapa.
A Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) é feita com antirretrovirais utilizados antes da exposição para reduzir o risco de adquirir a infecção pelo HIV. Pessoas que se entendem sob risco de contrair o HIV tomam a medicação de forma contínua ou sob demanda, com acompanhamento médico.
A Profilaxia pós-exposição (PEP) é o uso de medicamentos após uma exposição considerada de risco. É uma urgência médica que deve ser iniciada o mais rápido possível, em no máximo até 72h depois de qualquer situação em que exista risco de contágio. A duração da PEP é de 28 dias após a exposição.
Diagnóstico
Segundo o Ministério da Saúde, a recomendação é de que se houver sexo desprotegido ou compartilhado seringas, o teste de HIV é necessário. O diagnóstico da infecção pelo HIV é gratuito na rede pública de saúde, e feito a partir da coleta de sangue ou por fluido oral.
Há possibilidade de realização de exames laboratoriais ou testes rápidos. Por meio de testes rápidos, em 30minutos sai o resultado.
“Esses testes são realizados gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), nas unidades da rede pública e nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA)”, explica o Ministério da Saúde.
Tratamento
O atendimento e o tratamento de pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) são gratuitos nos serviços de saúde do Sistema Único de Saúde. Desde 1996, o Brasil distribui gratuitamente os medicamentos antirretrovirais a todas as pessoas vivendo com HIV que necessitam de tratamento.
Atualmente, existem 22 medicamentos, em 38 apresentações farmacêuticas. O tratamento habitual de quem vive com HIV são dois comprimidos tomados juntos uma vez ao dia.
Impacto do aumento da contaminação para a saúde pública
O impacto do aumento dos casos de HIV pode ser visto em diversos aspectos, como ressalta a infectologista Juliana Lapa.
“Considerando que hoje a maioria dos infectados são jovens, caso não sigam o tratamento é um grupo populacional economicamente ativo importante”, diz a médica.
Em relação ao tratamento, do ponto de vista dos gastos públicos, segundo a infectologista, um paciente HIV não aderente ao tratamento impacta com internações prolongadas, podendo evoluir para complicações incapacitantes.
“Por isso, vale tanto a pena os gastos no tratamento de quem tem HIV e na prevenção para não aquisição da doença”, diz Juliana Lapa.