Neste ano, serão vendidos mais veículos elétricos no país asiático do que em todo o resto do mundo
Zhang Youping, aposentada, comprou um pequeno SUV da BYD – a maior fabricante de veículos elétricos da China – em um salão de automóveis por cerca de US$ 20 mil no mês passado. A família dela adquiriu três carros movidos a gasolina na última década, mas recentemente ela ficou preocupada com os preços do combustível e decidiu comprar um carro elétrico “para economizar dinheiro”. Alguns meses antes, o filho dela também optou por um veículo elétrico. Um modelo hatchback de US$ 10 mil da Leapmotor, outra montadora chinesa.
Este ano, 25% de todos os automóveis novos comprados na China serão veículos completamente elétricos ou modelos híbridos plug-in. Existem, segundo algumas estimativas, mais de 300 empresas chinesas produzindo carros elétricos, que vão desde ofertas promocionais abaixo de US$ 5 mil até modelos de ponta que competem com a Tesla e as montadoras alemãs. Existem aproximadamente 4 milhões de pontos para recarga de automóveis no país, o dobro do número de um ano atrás, e há mais deles a caminho.
Enquanto outros mercados de veículos elétricos ainda dependem bastante de subsídios e incentivos financeiros, a China entrou em uma nova fase: os consumidores estão avaliando as vantagens dos carros elétricos em comparação com aqueles movidos a gasolina com base nas funcionalidades e no preço, sem levar muito em consideração o apoio estatal. Já os Estados Unidos estão muito atrasados. Este ano, o país alcançou um patamar importante de veículos elétricos, com eles representando 5% de todas as vendas de automóveis novos. A China ultrapassou essa marca em 2018.
Uma potência
O principal líder chinês, Xi Jinping, declarou em 2014 que a produção de veículos elétricos era a única maneira de a China se transformar “de um país com grande mercado automobilístico em uma potência automobilística”. Enfatizando suas ambições, a China estabeleceu uma meta ambiciosa: 20% das vendas de carros novos seriam veículos elétricos até 2025. E provavelmente alcançará essa meta este ano, três antes do previsto. O país já é o maior mercado de veículos elétricos e também um dos que mais crescem, com a expectativa de as vendas dobrarem este ano para cerca de 6 milhões de carros – mais do que o restante do mundo somado.
Das dez marcas de veículos elétricos mais vendidas do mundo, metade é chinesa, liderada pela BYD, que fica atrás apenas da Tesla em participação de mercado global e está começando a exportar seus automóveis elétricos. E não são apenas as vendas dos carros que estão tendo sucesso na China. As fabricantes chinesas de baterias CATL e BYD são os maiores players do setor, embora Pequim mantenha um controle rigoroso sobre o acesso a matérias-primas vitais.
A forte demanda por veículos elétricos é um ponto positivo em uma economia que, não fora isso, estaria estagnada, pois lida com um mercado imobiliário em crise e prejudicado pelas políticas de combate à covid-19.
Como parte de seu plano de estímulo econômico, a China disse que continuaria a investir nos automóveis elétricos. Pequim afirmou no mês passado que estava prorrogando uma renúncia fiscal para carros novos elétricos até 2023 com um custo total de US$ 14 bilhões, em vez de encerrá-la este ano, conforme programado.
Gou Chaobo, 27 anos, funcionário de uma construtora, decidiu recentemente trocar seu sedã movido a gasolina por um veículo elétrico, mas disse que os incentivos financeiros não influenciaram a decisão. Em Chengdu, a megacidade no sudoeste da China onde Gou vive e trabalha, os automóveis convencionais não podem transitar na estrada certos dias da semana para ajudar a reduzir o congestionamento e a poluição. Já os carros elétricos são livres para ir e vir. Além disso, o estacionamento é gratuito nas primeiras duas horas nos estacionamentos públicos para os modelos elétricos.
Gou disse que as despesas com um automóvel elétrico, segundo seus cálculos, são inferiores a 10% daquelas com um carro movido a gasolina. Assim que ele escolher um modelo específico, também será beneficiado com um subsídio do governo que pode chegar a aproximadamente US$ 2 mil do preço de venda, dependendo do veículo. Depois, o governo abrirá mão de um imposto de compra de 10% sobre os automóveis de “energia nova” – uma denominação geral usada na China que também inclui modelos híbridos plug-in.
Nova energia
Gou, que estava de olho em um sedã de médio porte da marca chinesa XPeng no salão do automóvel de Chengdu, disse que decidiu comprar um elétrico “porque a energia nova é o caminho do futuro”.
Em outros mercados, os carros elétricos das montadoras tradicionais são muitas vezes considerados modelos de luxo, enquanto as marcas chinesas também competem com modelos acessíveis como o Wuling Hongguang Mini – um hatch de quatro lugares vendido por US$ 4.500 e que foi o elétrico mais vendido da China em 2021. Ele é produzido por uma joint venture da General Motors e das montadoras chinesas SAIC e Wuling.
Demanda acelera o ingresso de fábricas na nova geração
Na indústria automobilística da China, a concorrência é acirrada, com novas montadoras surgindo constantemente, deixando a maioria das empresas chinesas nadando em prejuízos e muitas quase certas do fracasso diante dos desafios da produção de veículos elétricos na escala necessária para reduzir os custos. Passar de vender carros para o mercado interno para exportá-los, porém, vem com obstáculos, como conflitos a respeito das garantias. No entanto, conforme as vendas de automóveis movidos a gasolina caem, as montadoras chinesas têm cada vez menos alternativas a não ser apostar nos modelos elétricos.
No mês passado, a Geely Automobile Holdings, uma das montadoras de maior destaque da China, com investimentos na Volvo Cars e na Mercedes-Benz, disse que pretende vender a mesma quantidade de veículos elétricos e híbridos no próximo ano que de modelos convencionais com motores de combustão interna.
Jason Low, principal analista da empresa de pesquisa Canalys, com sede em Xangai, disse que as marcas chinesas de carros elétricos têm sido mais audaciosas do que as montadoras estrangeiras na adoção de novas tecnologias nos veículos, como recursos de entretenimento e controles ativados por voz.
A escolha
Zhang Youping, a aposentada que comprou um SUV elétrico, disse que escolheu a BYD porque preferia uma marca mais conhecida. Ela disse que parte da cautela ao escolher a montadora se devia ao fato de o ar-condicionado do modelo mais barato adquirido pelo filho ter quebrado depois de alguns meses.
Ela também considerou alguns modelos elétricos estrangeiros, mas as funcionalidades reduzidas não atendiam às suas preferências. “Não vinha com absolutamente nada. Não gosto muito desse design”, disse Youping. “É um pouco diferente do estilo de vida chinês.
Com Estadão via The New York Times