*Nelson Valente
A Construtora Norberto Odebrecht (CNO) foi fundada em 1944 em Salvador, Bahia, pelo engenheiro civil Norberto Odebrecht, então com 24 anos de idade, em resposta à situação crítica de insolvência pela qual passava a empresa de construção de seu pai, o também engenheiro civil Emílio Odebrecht.
Antes disso, em 1856, seu avô, o engenheiro agrimensor Emil Odebrecht, formado pela Universidade de Greifswald, na Prússia, imigra da Alemanha para o Brasil, desembarcando em Santa Catarina para trabalhar em demarcação de terras, instalação de linhas telefônicas e construção de ferrovias sendo que muitas dessas atividades ocorreram em condições adversas, tendo ainda participado como engenheiro militar voluntário na Guerra do Paraguai.
As virtudes pessoais, profissionais e sociais de Emil vão se refletir na vida de cada um dos seus netos.
Seu filho Emílio, recém formado em engenharia civil, junto com um colega, funda em 1923 uma empresa de engenharia na Bahia, a Odebrecht & Cia., e é considerado como um dos pioneiros responsáveis pela introdução da técnica de construção civil pelo concreto armado no Nordeste brasileiro.
Entender a família Odebrecht, com sua formação e educação luterana, cujas características são o amor ao trabalho e a retidão de caráter, virtudes estruturais da atual filosofia Odebrecht, é fundamental para uma melhor compreensão da trajetória dessa empresa, de uma pequena firma local para uma empresa nacional, internacional e, depois, global. Entretanto, para um maior entendimento de tudo isso, é necessário uma breve contextualização.
Como é de domínio público, no período que corresponde à década de 1850 até a década de 1930, o Brasil começou a desenvolver e investir em importantes áreas de infraestrutura básica, a saber, estradas de ferro, portos, edifícios públicos, sistemas de saneamento, transporte, estradas, pontes e outras.
O movimento maior era a necessidade de escoar as exportações de café, cacau, açúcar e outros produtos agrícolas e minerais e importar bens de consumo duráveis e máquinas e equipamentos.
Com o aumento do comércio e da urbanização, a demanda de energia elétrica também começou a crescer, o que levou à necessidade de construção de barragens e usinas hidroelétricas.
Todo esse período foi importante porque criou a demanda necessária para o desenvolvimento do setor de construção pesada.
A ausência de capacitação tecnológica foi um grande problema para realizar essas obras e, como não existiam empresas nacionais capacitadas, a demanda era atendida basicamente por construtoras estrangeiras. Entretanto, esse cenário começa a mudar no período do pós-guerra quando o governo brasileiro começou a investir no transporte rodoviário.
As estradas rodoviárias desse período eram construídas na maioria das vezes sem pavimentação e com péssimas condições de uso, o que reforçava a urgência na criação interna de capacitação tecnológica.
Ainda no governo Getúlio Vargas, criou-se a Lei Joppert, de 1945, onde o Estado privilegiava a contratação de construtoras nacionais para realização dessas obras. Essa Lei é considerada como um marco para o início do desenvolvimento de grandes empresas de construção pesada no país.
O período de 1956 a 1961, durante o governo de Juscelino Kubitschek, também foi significativo para o setor da construção civil pesada com investimentos para construção de barragens, usinas hidroelétricas, portos, o rodoviarismo e a construção de Brasília. Foi um momento em que o Estado forneceu, através de seus diversos instrumentos de política econômica, condições favoráveis para o surgimento das grandes construtoras brasileiras.
No Governo de Juscelino Kubitscheck (1956-1961), os escândalos ocorreram em função da construção de Brasília, a nova Capital Federal. As rendas fáceis dos empresários, cresceram porque as obras de Brasília eram dispensadas de licitações.
A certa altura, como faltassem recursos para o financiamento das obras da Capital, o presidente JK planejou lançar mão dos fundos da Previdência Social sob os protestos do PTB, donatário da área. Entretanto, as obras contra a seca, agenciadas pelo PSD, converteram-se em verdadeiro maná”.
Em 1958, a fim de eleger candidatos favorecidos pelas chamadas folhas de funcionários fantasmas, chegou a faltar dinheiro em agências do Banco do Brasil, como a da Paraíba. Foi assim, segundo ele, que Jânio Quadros se elegeu presidente da República: denunciando a corrupção e ameaçando mostrá-la ao antecessor, JK, no ato da posse. JK reagiu ameaçando esbofetear Jânio. Com isso, a bomba de Jânio não explodiu durante a posse, mas à noite, em discurso pelo programa radiofônico A Voz do Brasil, com JK já fora do País.
Brasília (…) éa única cidade do mundo cuja construção pôde ser apurada sob todos os aspectos— jurídicos, políticos, técnicos, econômicos, financeiros e sociais — com o maior rigor, não só por determinação do sr. Jânio da Silva Quadros, logo que assumiu a Presidência da República, em 31 Jan. 1961, como também, e bem antes dele, por decisão da Câmara dos Deputados(…) Resolução nº 37, em Set. 1960, uma Comissão Parlamentar de Inquérito para Investigar as Condições de Construção de Brasília, Organização e Regulamentação de seus Serviços Públicos”.
Deixa também um rastreamento dos resultados das Comissões de Sindicância instauradas pelo governo Jânio Quadros — as recomendações, e as últimas pistas de cada relatório. Ainda aguardam que, um dia, os pesquisadores vão atrás.
Além da CPI e das Comissões de Sindicância do governo Jânio Quadros, a construção de Brasília também foi investigada por um ou vários Inquéritos Policiais Militares (IPM) do governo militar, a partir de 1964.
Em Set. 1960 — ainda nos últimos meses do governo JK, portanto, — foi instituída na Câmara dos Deputados uma “Comissão Parlamentar de Inquérito para Investigar as Condições de Construção de Brasília, Organização e Regulamentação de seus Serviços Públicos”.
Os trabalhos da CPI prosseguiram pelos últimos cinco meses do governo JK, atravessaram os sete meses do governo Jânio Quadros e se estenderam até o governo João Goulart.
A CPI instituiu três subcomissões — de Juristas, de Engenheiros, e de Contadores — para assessorá-la nessas áreas.
A Subcomissão de Contadores — formada por Orlando Travancas, Hugo Brasil Cantanhede e Newton dos Santos Pinto (coord.) — apresentou 14 relatórios, o primeiro datado de 23 Mar. 1961 e o último de 18 Out. 1962.
Onze desses relatórios esmiúçam todo o investimento feito pelas “Caixas Econômicas Federais” do Rio de Janeiro e de São Paulo; Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap); Fundação da Casa Popular; Grupo de Trabalho de Brasília (GTB); Banco do Brasil; Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado (IPASE); e Institutos de Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI); dos Ferroviários e Empregados em Serviços Públicos (IAPFESP); dos Bancários (IAPB); dos Empregados em Transportes e Cargas (IAPETC); e dos Comerciários (IAPC) — até o custo por metro quadrado construído, passando por materiais, aluguel de máquinas, taxas de administração, mão de obra, encargos sociais, alojamentos provisórios, cantinas de obra e juros.
Algumas dessas empresas de construção pesada estiveram durante muito tempo entre as dez maiores empresas do Brasil. A Construtora Norberto Odebrecht não surgiu desse movimento e nem trilhou esse caminho. A maior construtora em faturamento do Brasil, surgiu de uma grave crise e, até meados da década de 1950, atuou localmente em Salvador e no interior da Bahia.
No início da década de 1940, com 21 anos e ainda no terceiro ano do curso de engenharia da Escola Politécnica da Salvador, Norberto Odebrecht assumiu a empresa de seu pai em péssimas condições financeiras. Durante a Segunda Guerra Mundial, houve falta de material de construção no Brasil, o que aumentou muito seus preços. Como a empresa paterna, a Odebrecht & Cia., já fora contratada com preços fixos para as obras, seus custos aumentaram a ponto de colocar a empresa sob o risco de falência.
Norberto Odebrecht foi obrigado a fechar a empresa do pai e, em 1944, iniciou a Odebrecht a partir dos recursos existentes na antiga empresa. Segundo o próprio Norberto, “recebi de meu pai o mais importante ativo que uma empresa pode ter: pessoas educadas para servir”. Na mesma entrevista, Norberto Odebrecht revela que tinha obrigações morais, familiares e pessoais para continuar o trabalho na empresa do pai.
Segundo seu relato, desde os 15 anos já convivia com mestres-de-obras que lhe deram as primeiras aulas sobre construção. Trocou a mensada pelo trabalho assalariado e aprendeu ser pedreiro, serralheiro, armador, chefe de almoxarifado, responsável por transporte.
Aprendeu também a cortar ferro, dobrá-lo e usá-lo na construção de armaduras para colunas, vigas e lajes; revestir paredes com argamassa, entalhar madeira e operar uma forja.
Nesse período, segundo seu relato, começou a ter suas primeiras experiências práticas de administração e gerência. Após uma doença que o deixou na cama por 47 dias, Norberto percebeu que a empresa não podia depender só dele. Então, ainda em 1945, convidou os jovens estudantes de engenharia Francisco Valadares e Otto Schaeppi para ajudá-lo a estruturar a empresa que surgia naquele momento, a Construtora Norberto Odebrecht Ltda. (CNO).
No fim da década de 1940, a empresa já era uma das maiores da Bahia. O problema da dívida da empresa do pai foi solucionado ao serem realizados três pactos: um pacto político com o Banco da Bahia que lhe permitiu o refinanciamento das dívidas e captação de novos clientes; um pacto econômico que garantiu aos clientes obras de qualidade como menores prazos e custos; e um pacto social, que deveria promover uma maior união entre empresários e trabalhadores na empresa.
Na prática, parte dos lucros obtidos com as obras era distribuída aos que participaram diretamente da obra e parte era destinada ao pagamento das dívidas da Odebrecht & Cia. Com essas ações, a nova empresa conseguiu liquidar todas as dívidas em 1948.
No campo técnico da construção, a empresa inovou na forma como realizava suas obras. A prática comum na época era levantar toda estrutura de concreto do edifício e então realizar cada etapa seguinte, como paredes, reboco, porta e janelas, acabamento e etc. Esse esquema foi mudado para a realização de todas as etapas paralelamente, se possível.
O edifício Belo Horizonte, um prédio de nove andares construído para a imobiliária Correa Ribeiro é considerado como um marco no desempenho da empresa nessa época, pois foi construído em nove meses quando o prazo padrão da época era de três anos.
Com isso, a Odebrecht ganha fama de eficiência, inovação e de entregar obras antes do prazo acordado. Depois de muitas outras obras locais, é também dessa época o surgimento de uma lenda que marca a empresa: “o livro preto da Odebrecht”.
De fato, Norberto e outros engenheiros, administradores e advogados registravam vários processos e experiências da empresa relacionadas desde a construção, compra de insumos, tratamento de clientes e subordinados, soluções técnicas efetivadas e até seleção de pessoal.
Essas anotações foram compiladas e organizadas em um livro de capa escura. A ideia era de que, com essas informações, empregados mais experientes pudessem ajudar no desenvolvimento de novos empregados. Entretanto, a leitura e domínio do conteúdo desse livro começaram a ser visto como uma forma de ascensão profissional pelos funcionários de empresa, o que o levou a ser muito lido e discutido por todos, gerando uma cultura e a uma forma de competição saudável de aprendizado e treinamento que ia desde o pedreiro até o novo engenheiro contratado.
O desenvolvimento dos funcionários começou a fazer parte da base filosófica da empresa. Desde então e depois de certo tempo envolvidos com problemas na justiça trabalhista, a CNO passou a ter mais cuidado e dar mais atenção aos conceitos administrativos e também se preocupar mais com o bem estar de seus funcionários, o que se tornou outra marca da empresa: o desenvolvimento de um esprit de corps entre seus empregados e a empresa. Outra marca inovadora desse período: a descentralização produtiva e administrativa em suas obras.
A ideia era identificar, integrar e desenvolver jovens com talento para o empreendedorismo. Assim, os mestres-de-obra passaram a serem responsáveis pela formação desses futuros líderes e também foram se formando como uma espécie de ‘empresários` de obras.
Deles dependia o esquema de descentralização que ocorreu nos canteiros de obra. Como o prazo era um fator crítico, muitas vezes os mestres-de-obra solicitavam materiais de construção mais caros para agilizá-las.
Essa independência chamou a atenção, pois não era comum no setor que procedimentos como compras, admissão e outras ações fossem decididas por esses funcionários.
Boa parte dos ganhos contratuais obtidos com a entrega antecipada das obras eram distribuídos entre os que participaram diretamente delas, uma política de delegação de responsabilidades que estimulou a produtividade de seus empregados por meio de recompensa financeira que até os dias de hoje faz parte da filosofia das empresas Odebrecht.
Em 1950, a CNO construiu sua primeira usina hidroelétrica. A usina de Correntina era pequena, mas possibilitou a aquisição de um conhecimento que levou a empresa a ser uma das principais construtoras nessa área.
A década de 1950 foi importante na trajetória da CNO. Mesmo com o cenário nacional positivo para o setor da construção pesada (e talvez por isso mesmo) a CNO começa seu processo de diversificação de atividades.
Em 1952 foi fundada a S.A. Ituberá Comércio e Indústria (Saici) em associação com os grupos Firestone e Matarazzo.
O objetivo dessa empresa era explorar os recursos naturais da região de Ituberá para fabricação de borrachas (seringueiras) e óleos (dendezeiros). Em pouco tempo, instalou uma pequena hidroelétrica e uma serraria para transformar a madeira extraída em folhas de compensado imunizadas. Depois dessa primeira diversificação de atividades realizada por associação para crescimento e integração, outras vieram. Mesmo assim, a verdadeira fase de diversificação dos negócios, de entrada em outros setores não vinculados à construção pesada, da CNO começa efetivamente em 1976, quando o Conselho da Administração da empresa divulga oficialmente os novos objetivos:
a) a administração de cada um dos negócios considerados individualmente e administração da carteira de negócios, entendida como administração das relações entre negócios existentes e desenvolvimento de novos negócios.
A partir de então, a diversificação de negócios da CNO, sempre por meio de fusões, associações e aquisições, ganha força e movimento. Atualmente, envolve empresas dos ramos da mineração, siderurgia, metalurgia, navegação, serviços de apoio à manutenção de máquinas e equipamentos, indústria metal-mecânica, empreendimentos imobiliários, cimento, aço, indústria de pré-moldados, asfalto, seguros, previdência, mercado financeiro, empresas de perfuração de solos, tecnologias de ponta de eletrônica e automação, montagem industrial, telefônica, energia elétrica, papel e celulose, concessões rodoviárias e, com destaque, a indústria petroquímica.
Voltando a década de 1950, em 1954, outro marco na história da empresa: o contrato com a então recém fundada (novembro de 1953) Petrobrás para construção do oleoduto Catu-Candeias de cerca de 80 km e que levava o óleo extraído do campo de Catu para a refinaria de Mataripe.
Essa parceria será fundamental para a expansão e consolidação em nível nacional da empresa. De fato, com o sucesso da obra, forma-se uma espécie de parceria entre a Petrobrás e Odebrecht, que já dura quase 63 anos incluindo obras como construção e montagem de refinarias, plataformas marítimas, estações de tratamento de águas, laboratórios, instalações de apoio, pontes, canais, barragens, armazéns, casa de força, dragagens, residências, clubes, estradas, edificações, portos e a perfuração de 140 poços no mar.
Sediada em Recife, onde a CNO abriu uma filial em 1962, esse órgão passou a coordenar e financiar um grande número de obras em infraestrutura nas regiões Norte e Nordeste. Definitivamente, a CNO aproveitou essa oportunidade.
Nesse período e consolidando sua atuação regional, a CNO trabalhou na construção de plantas industriais na região Nordeste. Zebiden (2007) apresenta uma lista dessas obras. Algumas mais relevantes: construção da fábrica da montadora de veículos da Willys-Overland e os parques industriais da Companhia de Borracha Sintética (Coperbo) e das Tintas Coral do Nordeste, as três em Pernambuco, da Alpargatas (CE) e da Rhodia, na Bahia. Em obras de infraestrutura, duas foram marcantes pelas complexidades e dificuldades em logística: a Barragem de Pedras, na Bahia e a Ponte Propriá-Colégio sobre o Rio São Francisco e na divisa de Sergipe com Alagoas, obra com 832 m. de extensão e fundações com profundidades de até 70m.
No final da década de 1960, com mais de 500 obras em seu histórico e a experiência de ter realizado obras de grande porte e complexidade logística considerável, a CNO já era uma das principais construtoras do Nordeste.
Esses trabalhos regionais de porte considerável capacitaram à empresa e suas equipes para novos desafios, agora de alcance nacional. Também, até o final dessa década a CNO já tinha incorporado onze empresas a seu grupo para auxiliar a atividade de construção. Empresas de fundações, de mineração, de construção metálica, de suprimento de insumos básicos, de transporte, de bombeamento de concreto, de produtos pré-moldados e outras. Outro momento de grandes investimentos e financiamentos públicos em obras de infraestrutura ocorreu na década de 1970, período conhecido como do “milagre econômico”. De fato, o período de 1967 a 1973, no governo Médici, as obras públicas, organizadas no PED (Plano Estratégico de Desenvolvimento) e coordenadas pelo então Ministro da Fazenda, Antônio Delfim Neto, tiveram papel relevante nos gastos públicos e influência positiva nos índices de crescimento econômico verificados.
No período seguinte, de 1974 a 1980, já no governo Geisel, o país ainda mostra taxas consideráveis de crescimento econômico e de gasto públicos com obras de infraestrutura. Essas obras eram derivadas do 2º PND (Plano Nacional de Desenvolvimento). Porém, esse crescimento teria sido conseguido por meio de uma “marcha forçada”, com aumento no endividamento interno e externo do setor público e a elevação dos índices de inflação. Em relação à CNO, a construção do edifício-sede da Petrobrás, com 27 andares e 117 m de altura, no Rio de Janeiro em 1969 é considerada como outro marco da trajetória da empresa representando sua expansão para a região sudeste do país. A década de 1970 apresenta novos desafios e diversificação em relação os produtos finais: construção de metrôs, usinas nucleares, emissários submarinos, aeroportos e pontes com grandes vãos. As demandas por trabalhos das construtoras, nesse período, exigiam mais atributos no gerenciamento de grandes projetos simultâneos, controle de equipamentos e tecnologias de ponta e cumprimento de prazos do que atuação na construção propriamente dita. São resultados desse período o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, o campus da Universidade da Guanabara, atual UERJ, e a Usina Nuclear de Angra dos Reis. A empresa também começa a atuar em outras regiões do país, como a construção da Ponte Colombo-Salles, ligando a Ilha de Santa Catarina ao continente e a recuperação do Teatro do Amazonas, confirmando a presença e atuação nacional da construtora. Todas essas obras de engenharia especial foram entregues até meados da década de 1970, quando a empresa já se consolida nacionalmente. Paralelamente a isso, além da maior capacitação tecnológica, a estrutura organizacional da CNO vai evoluindo, se sofisticando, se tornando flexível (como expôs Hymer) para atender particularidades locais e adquirido conhecimentos técnicos. Nesse período, a matriz se desenvolve para gerenciar várias grandes obras espalhadas por todo país. Um outro marco da empresa ocorreu quando, em 1973, participou da construção do Pólo Petroquímico da Camaçari, na Bahia. O trabalho nesse setor despertou interesse do grupo e, em 1979, com a compra de 20% das ações preferências da Petroquisa, a entrada nesse setor é consolidada. Atualmente, o ramo petroquímico da Odebrecht é o que mostra maior participação relativa nas receitas do grupo. Entretanto, como o objetivo desse trabalho é pesquisar a internacionalização do grupo no ramo de serviços de engenharia, deixaremos esse ponto importante para futuras pesquisas. O setor público, de um modo geral, sempre foi o principal cliente da empresa, tendo em vista sua significativa participação em construções de infraestrutura como barragens, hidroelétricas, termoelétricas, usinas nucleares, linhas de transmissão, edificações, rodovias, ferrovias, metrôs, túneis, pontes, viadutos, aeroportos, portos, saneamento, irrigação, mineração, montagem, oleodutos, gasodutos, óleo e gás.
Na década de 1980, os altos índices de inflação mostravam o desequilíbrio econômico e financeiro do setor público brasileiro e a grave crise econômica por que passava o país. As diversas tentativas de estabilização econômica (Plano Cruzado I e II, Plano Bresser e o Plano Verão) não apresentaram muitos resultados para tanto. Os reflexos desse período para as obras de infraestrutura nacionais foram de paralisação quase que completas. Entretanto, a CNO já tinha diversificado suas áreas de atuação e, em relação a serviços de engenharia pesados, estava trabalhando em mercados externos, o que manteve uma relativa estabilidade em sua estrutura e campos de atuação. Relativa porque os maiores investimentos do grupo nesse período foram realizados pela Odebrecht Química S.A. e por sua subsidiária Empresas Petroquímicas do Brasil (EPB).
Em 1979, depois de 34 anos de atuação no segmento de engenharia e construção, a Odebrecht continua com seu processo de diversificação de suas atividades com participações acionárias e composição das diretorias na Companhia Petroquímica de Camaçari, Salgema, Poliolefinas S.A. e Unipar.
Um outro grande acontecimento para a Odebrecht em 1980 foi a incorporação da CBPO, Companhia Brasileira de Projetos e Obras, fundada em 1931 pelo engenheiro paulista Oscar Americano da Costa, que, na época, era a sexta maior construtora do Brasil em faturamento e com uma extensa lista de obras de vulto realizadas em quase 50 anos de existência. Essa compra fortaleceu a empresa em sua qualificação na área de construção pesada, pois a CBPO era uma das maiores construtoras brasileiras, com um corpo técnico de alto nível que já tinha realizado obras como as usinas de Itaipu, Xavantes, Capivara, Nova Avanhandava, Rosana e Foz do Areia, entre outras; e mais as rodovias Imigrantes, dos Trabalhadores e Castelo Branco, entre outras. A década de 1980 foi marcada por reestruturações, reorganizações e diversificação nas áreas de atuação do grupo.
Em 1981, a Odebrecht Participações e Investimentos S.A. (Opisa) passou a se chamar Odebrecht S.A. (OSA), assumindo a condição de holding, abrindo capital e transformando diretores, integrantes e participantes de obras em acionistas.
Em 1981 foi criada a holding Odebrecht S.A. (OSA), empresa que representa e consolida o grupo, com o objetivo de manter a unidade filosófica e proporcionar o redirecionamento estratégico do conjunto de empresas que formam a sociedade. Com essa mudança, a OSA assume o controle direto de todas as empresas não relacionadas à construção e também a responsabilidade pelas estratégias de negócios, investimentos e na contratação de recursos humanos de alto nível.
Na linha da descentralização, a parte operacional de cada empresa controlada continua sob comando de seus respectivos diretores e/ou líderes. Essa descentralização e a participação nos resultados dos diretamente envolvidos nas obras acabaram por formar a base do que ficou reconhecido como Princípios, Conceitos e Critérios da TEO ou Tecnologia Empresarial Odebrecht, que se tornou uma “marca” da empresa. A TEO merece comentários. Todos os funcionários da Odebrecht que tive contato por meio de entrevistas ou conversas informais falaram com conhecimento, respeito e admiração dela. A TEO está organizada em um livro de três volumes com o título Sobreviver, crescer e perpetuar destinados para melhorar a organização e resultados da empresa. É quase que um guia comportamental e profissional para orientar ações dos integrantes da empresa. A TEO também trabalha na elaboração das características e das competências que são desenvolvidas na OSA, CNO e Braskem. Seu objetivo é criar um referencial para o comportamento e ações das empresas e de seus funcionários. As Características são:
1) Espírito de servir; ambição de propósitos; criatividade e inovação.
2) Objetividade e determinação; maturidade e confiabilidade; espírito positivo e construtivo; mobilidade e adaptabilidade.
As Competências seriam:
1) Descentralização através da delegação planejada e
2) Parceiras; capacidade de empresariar, liderança; educação pelo trabalho; capacidade de conceituar e agir; capacitação específica; satisfação do cliente e excelência de resultados.
Voltando à década de 1980, outros fatos marcantes desse período: em 1984 a OSA fundou o Núcleo da Memória Odebrecht (fundamental para essa pesquisa) com objetivo de preservar a história de conquistas, desafios, erros e acertos do grupo. Em 1985, Emílio Odebrecht assume o cargo de Diretor-Presidente da CNO. Nesse ano, a estrutura da OSA é formada definitivamente, considerando a responsabilidade por resultados da holding com sua organização dinâmica, formação e atuação de um Centro de Resultados de negócios e de suas empresas/unidades e da implementação de um Sistema de Comunicação criado e implantado entre seus diversos níveis operacionais, ou seja, a holding, unidades, negócios e empresas. Nesse mesmo ano, outra obra de destaque: a entrega da Rodovia Transmaranhão, com 1.194 km de extensão, ligando o extremo Norte ao extremo Sul do Estado. Em 1986, a compra da Tenenge – Técnica Nacional de Engenharia. Com essa aquisição a Odebrecht ganhou força no segmento de construção industrial. A Tenenge tinha sido fundada em 1955 pelo engenheiro paulista Antônio Maurício da Rocha e, ao longo de sua história, já tinha participado das montagens de quase a totalidade do complexo siderúrgico nacional e da instalação de mais de um terço do parque hidrelétrico do país.
Em 1987, a primeira obra no Equador: o Projeto de Irrigação Santa Elena, na região de Guayaquil e, em 1988, outro marco na história do domínio de técnicas de engenharia pela CNO, a entrega da plataforma semi-submersível Petrobrás 18, para produção em águas profundas, Essa plataforma teria aumentado a produção brasileira de petróleo em 100 mil barris/dia.
Em 1989, começou a ser desenvolvido o SAD, Sistema de Apoio à Decisão, para auxiliar os gerentes de contratos de obras na obtenção de informações para melhorar suas atuações que ganharam complexidade com o crescimento dos negócios internacionais de construção.
Em maio de 1991, Norberto Odebrecht transferiu o cargo de Diretor-Presidente da, agora já restruturada e transformada em holding, a Odebrecht S.A. (OSA) para seu filho Emílio Odebrecht.
Em 1998, Norberto Odebrecht deixou definitivamente os negócios, transferindo o cargo da presidência do Conselho de Administração da Odebrecht S.A. para seu filho, Emílio.
Em 1999, foi criado o Fórum de Engenharia com o objetivo de promover, integrar, desenvolver e difundir os conhecimentos da CNO. Comunidades virtuais foram criadas para possibilitar esse intercâmbio.
Em 2000, a Revista norte-americana Engineering News Records (ENR), considerada uma referência internacional do setor de construção pesada, elege CNO como a empresa líder na construção internacional de usinas hidrelétricas. Nesse ano, foi inaugurado o complexo Turístico Costa do Sauípe, na Bahia, o maior empreendimento hoteleiro do país. Também em 2000, a Odebrecht participa sob o regime de consórcio de um dos maiores e mais modernos empreendimentos realizados pela Ford Motor Company em todo mundo: o Complexo Industrial Ford Nordeste.
Em 2001, o fim da construção da Usina termoelétrica de Três Lagoas. Essa construção de engenharia especial foi a primeira usina térmica movida a gás natural, executado no Mato Grosso do Sul. Também nesse ano, a Odebrecht inicia a construção da segunda ponte sob o Rio Orinoco, na Venezuela. Em relação às políticas de reestruturações, também em 2001 a OSA recomprou ações em poder de acionistas minoritários e cancelou o registro da empresa na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No mesmo ano, um levantamento da empresa verificou que cerca de 1.600 empresas, entre pequenas e médias, exportavam para 30 países onde a Odebrecht atuava. Essas exportações, desde botas, roupas, máquinas, equipamentos e outros produtos, como eram financiados pelo governo, tinham níveis de inadimplência próximos de zero. Também nesse ano, Emílio Odebrecht sai do cargo de Diretor Presidente da OSA assumindo o cargo de Presidente do Conselho. Em mesmo período, seu filho, Marcelo Odebrecht, assume a Presidência da CNO.
Em 2002, a OSA promoveu o 3º Encontro de Engenheiros para integração, desenvolvimento e difusão de trabalhos e pesquisas no ramo. Também nesse ano a conclusão das Hidrelétricas de Lajeado (850 MW), em Tocantins, e Cana Brava (450 MW), em Goiás, além da conquista de dois novos contratos: a Hidrelétrica do Peixe (452 MW), também em Tocantins, e a Hidrelétrica de Irapé (375 MW), em Minas Gerais. Nesse ano, a Odebrecht está classificada entre as cinco maiores construtoras mundiais de hidrelétricas.
Em 2003, a OSA teve seu milésimo integrante a completar 25 anos de tempo de serviço no grupo (para o final de 2008, espera-se que esse número seja maior que 1.500) além de promover cursos, debates e palestras sob novas formas de administração e gerenciamento de obras.
Em 2004, a Odebrecht foi reconhecida com a maior exportadora de serviços do país e comemora seus 60 anos e a marca de 25 anos de exportação de serviços.
Em 2005, com objetivo de aprimorar e difundir a TEO, a CNO criou o Programa de Desenvolvimento de Empresários (PDE). Nesse mesmo ano, é criada a Lumina Engenharia Ambiental Ltda.
Em 2006, a consolidação da estrutura atual do grupo em dez vetores:
1) A Odebrecht S.A. (OSA), controladora da holding de empresas não vinculadas à construção civil, é a empresa que representa e consolida o Grupo. Está voltada para a manutenção da unidade filosófica e para o direcionamento estratégico conjunto das empresas onde procura promover o desenvolvimento de pessoas e fortalecer e preservar o espírito de Grupo. É presidida por Emilio Odebrecht, presidente do Conselho de Administração e detém a totalidade do capital da Construtora Norberto Odebrecht S.A., da Odebrecht Investimentos em Infraestrutura Ltda., da Odebrecht Óleo e Gás Ltda., da Odebrecht Engenharia Ambiental Ltda. e da Odebrecht Empreendimentos Imobiliários, além do controle acionário da Brasken S.A. e da ETH Bioenergia.
2) A Construtora Norberto Odebrecht S.A. (CNO), presidida por Marcelo Odebrecht, é responsável pelo setor de construção civil pesada, prestação de serviços integrados de engenharia, projetos, suprimento e gerenciamento de obras civis, industriais e de tecnologia especial, desenvolvimento de projetos imobiliários e turísticos, prestação de serviços de engenharia ambiental, montagem eletromecânica de plantas e engenharia especializada em petróleo e gás.
3) A Braskem S.A., presidida por José Carlos Grubisish, contratado no mercado, é responsável pelo ramo químico e petroquímico, produção de matérias-primas para empresas petroquímicas de segunda geração, produção de resinas termoplásticas e pela produção de cloro-soda.
4) ETH Bioenergia S.A., investimentos no setor de açúcar e álcool, com foco na produção de etanol e açúcar e na co-geração de energia.
5) Odebrecht Investimentos em Infraestrutura Ltda., desenvolvimento e administração de projetos de infraestrutura com foco em concessões e parcerias público privadas.
6) Odebrecht Empreendimentos Imobiliários S.A., responsável pela construção de edificações, que marcam toda a história do grupo. São mais de 60 anos de atuação na área imobiliária, com obras executadas no Brasil, Angola, Venezuela, Estados Unidos e Alemanha. Atualmente, a empresa atua de forma integrada e planejada em projetos residenciais, empresariais, comerciais e de turismo em todo Brasil.
7) Odebrecht Óleo & Gás Ltda., responsável por soluções para a indústria de óleo e gás desde a concepção da engenharia à operação de campos de petróleo, com foco na prestação de serviços integrados, investimentos em oportunidades de exploração, produção, afretamento e operações em plataformas.
8) Odebrecht Administradora e Corretora de Seguros Ltda., responsável por proporcionar apoio em seguros e garantias a toda Organização, assegurando aos acionistas a proteção de seu patrimônio, mediante a identificação e gerenciamento de riscos. Cuida dos seguros de todas as operações de todas as unidades operacionais do grupo.
9) Odeprev. Elabora e opera planos de previdência no Brasil para integrantes da organização Odebrecht. Também tem o objetivo de preparar planos para o pós-carreira dos colaboradores proporcionando condições para que cada integrante construa seu futuro, acumulando patrimônio para si e para sua família.
10) Fundação Odebrecht. Instituição sem fins lucrativos que promove a apoia programas de interesse público com o objetivo principal de promover a educação de adolescentes para a vida e o trabalho.
Em 2008, a Fundação Odebrecht completou 43 anos de atuação baseando seu trabalho nos capitais produtivos, humano, social e ambiental.
Em 2007, a empresa consolida sua liderança nacional e na América Latina com cerca de 160 obras sendo realizadas simultaneamente em 16 estados brasileiros e 18 países nos quatro continentes. O século XXI inicia-se com a Organização transformada em uma verdadeira empresa global.
Em julho de 2008, um grupo de executivos da empresa acompanha a comitiva do ex-Presidente Luís Ignácio Lula da Silva em sua viagem a países do Sudeste Asiático. Os países visitados, no caso, Vietnam e Indonésia, o foram com a intenção de iniciar um processo de entrada nesses mercados, principalmente através da construção de usinas hidrelétricas (Vietnã) e construção e montagem de usinas de Álcool (Indonésia), além de abrir portas para outras empresas brasileira na região do Sudeste Asiático. Notícias informais indicam que, nos planos e projetos de serviços de engenharia que serão oferecidos, estariam fechados até os financiamentos dessas obras.
*Nelson Valente é professor universitário, jornalista e escritor