Após o recurso, o processo volta para as mãos do ministro. Caso ele mantenha sua decisão, a questão será julgada pela segunda turma do STF, que deverá proferir uma decisão colegiada
ISAC GODINHO
A Defensoria Pública de Minas Gerais tentará novamente obter a absolvição de uma mulher condenada pelo furto de 18 chocolates e 89 chicletes. A instituição vai recorrer da decisão do ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), que manteve a condenação. Segundo a defensora pública Adriana Campos, devido ao recesso forense, algumas medidas não são apreciadas neste período. No entanto, o órgão já está com o recurso pronto para ser protocolizado.
Após o recurso, o processo volta para as mãos do ministro. Caso ele mantenha sua decisão, a questão será julgada pela segunda turma do STF, que deverá proferir uma decisão colegiada.
O crime ocorreu em 2013 na cidade de Boa Esperança, localizada no sul de Minas Gerais, a cerca de 280 km de Belo Horizonte. Os itens foram avaliados, à época, em R$ 50. O caso chegou ao STF por meio da Defensoria Pública de Minas, que buscava a absolvição da mulher por meio da aplicação do princípio da insignificância. É comum que ações como essa sejam levadas ao STF, buscando a liberação de pessoas condenadas por furtos cujos valores são muito baixos. “Mesmo oito anos atrás, R$ 50 não era um valor que justificasse a movimentação da máquina judiciária em torno de um furto tão insignificante”, afirma a defensora pública.
Segundo ela, a condenada era ré primária, tinha bons antecedentes, confessou o crime à época e não resistiu à prisão, o que afastaria a periculosidade dela na visão da Defensoria. Além disso, os bens furtados foram restituídos à vítima. “O único motivo que impediu que fosse aplicado o princípio da insignificância, que foi alegado em todas as instâncias, é que o furto teria sido praticado em concurso de agentes, pois ela estava acompanhada de outra pessoa”, diz Adriana.
No entendimento do ministro Nunes Marques, a jurisprudência do STF é firme na questão de que o furto qualificado por concurso de agentes, como no caso em questão, indica a reprovabilidade do comportamento. Por isso, ele indeferiu o pedido de habeas corpus.
“O Supremo Tribunal Federal já firmou orientação no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância no sistema penal brasileiro desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: ‘a) a mínima ofensividade da conduta do agente, b) nenhuma periculosidade social da ação, c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada’”, afirmou o ministro em sua decisão. A decisão do ministro também se amparou no parecer do Ministério Público Federal, que foi contrário à aplicação do princípio da insignificância no caso em questão.
De acordo com Adriana Campos, a decisão do ministro contraria outras tomadas pela segunda turma do STF, por isso, a Defensoria recorrerá.
Em 2017, a mulher foi condenada a dois anos de reclusão. Após uma apelação parcialmente atendida, em 2020, a pena foi reduzida para oito meses de reclusão. Desde então, a Defensoria recorreu às instâncias superiores, buscando a absolvição dela. “A primeira decisão data de 2017, mas o processo é de 2013. Nós temos, então, mais de oito anos em que a Justiça brasileira está trabalhando por conta desse furto de menos de R$ 50”, afirmou a defensora Adriana Campos.
Segundo ela, em levantamento feito pela Defensoria Pública de Minas Gerais em agosto de 2020, cerca de 70% dos pedidos de habeas corpus impetrados e aceitos pelo STF eram relativos à aplicação do princípio da insignificância em casos de furtos de produtos do gênero alimentício.
Em novembro, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, revogou a prisão de uma diarista que estava em uma cadeia em Minas Gerais sob a acusação de furtar água. A mulher, que é mãe de um menino de cinco anos, ficou presa por mais de cem dias.