Maria José Rocha Lima
Na Sessão Solene “Obrigado, Professor. Obrigada, Professora”, por mim proposta e realizada na Assembleia Legislativa da Bahia, em 11 de novembro de 1998, o professor e historiador Cid Teixeira foi homenageado pelo professor e intelectual baiano Roberto Albergaria. As declarações escritas para a sessão, na qual as pessoas famosas da Bahia homenagearam seus professores, marcaram, definitivamente, a Assembleia Legislativa da Bahia, promovendo a imagem positiva do professor, inaugurando uma nova forma de abordar a questão. O Poder Legislativo iniciou o pagamento da dívida do Estado contraída com o professor, especialmente com grandes mestres injustiçados quando igualados a maus profissionais que os governantes, exagerada e propositadamente, pinçam e divulgam para justificar os péssimos salários pagos aos professores.
O retrato dos professores nas últimas décadas, revelado naquela sessão, a partir da indicação de personalidades, poderá compor os autos de uma peça histórica e jurídica em favor dos mestres, forçando as autoridades ao pagamento de altos salários e indenizações em valores incalculáveis, além de direito a registros destacados na história da Bahia. São mestres colendos e proventos. São os produtores de arte, ciências e letras. São os formadores dos quadros intelectuais, artísticos e dirigentes da Bahia.
As homenagens prestadas, em apenas 20 linhas, pelas personalidades aos mestres, constituem, na maioria das vezes, peças literárias preciosas. Provam respeito, dedicação, reconhecimento e exaltação dos valores de dignidade, competência e talento dos seus mestres. Como a do professor Roberto Albergaria ao professor de quem tomarei de empréstimo para homenagear o professor e grande historiador da Bahia Cid Teixeira. Vejam esta preciosa declaração do professor e intelectual baiano Alberto Albergaria, louvando a erudição e versatilidade do mestre, a sua arte de ensinar e as lições que o seu aluno(ele próprio) aprendera, inclusive as críticas do mestre, feitas com muita manha, sofisticação e humor.
“De: professor Roberto Albergaria.
Para: professor Cid José Teixeira Cavalcante.
Na minha enroscada memória Cid José Teixeira Cavalcante foi o melhor professor que tive no atribulado curso de História que fiz em minha juventude – naqueles efervescentes tempos de militância política e agitação contracultural dos anos 70… Uma figura que por sua inteligência, independência e inimitável estilo pessoal muito marcou a minha formação, ainda que indireta e meio retrospectivamente. Alguém que conseguia associar uma imensa erudição a uma fertilíssima imaginação historiográfica (e histeriofônica!). Tudo isso envolvido por um arteiríssimo senso de humor (tentação permanente de escarafunchar o “outro lado” da verdade, arte sutil de ir se esgueirando cá e lá dos enfadonhos fardos das convivências acadêmicas e outras, arremessada solução de insolúvel…). Por sua finura de espírito, manhosa jovialidade e saboroso saber contrastava com a média ensinante ambiente – em particular com a mediocridade beletrística de uns, com a antolhado burocratismo de outros, com arrogância cientificista de muitos (estes melindrosos especialistas que desde então vêm dominando a cena ufbaiana, tão estreitamente, tão pesadamente…). Uma língua sempre bem-falante – e deliciosamente picante pelas beiradas (o resto é intriga dos maledicentes invejosos!). Um educador eficaz sem tricas pedagogistas, um sábio sério sem pose nem ranhetice de quem procuro imitar a “lição de história” recebida, tanto quanto possível… Mestre argucioso cuja imagem tanto me anima – sobretudo agora, quando eu, mais maduro e aquietado, passo a me identificar crescentemente àquele senhor risonho, bigodudo, dono de um vozeirão inimitável, com quem topei na minha desgarrada mocidade, antanho… Caprichada fortuna.