Maria José Rocha Lima
É muito alvissareira a notícia que nos foi dada pelo professor Arnaldo Niskier, presidente do CIEE/RJ, sobre a atenção ao ensino médio, com a criação da disciplina intitulada “Projetos de Vida”, que será oferecida a todos os alunos do ensino médio, em nível nacional.
A notícia veio no exato momento em que realizávamos o Projeto Sonhe, Realize, das Soroptimistas – SI Brasília Sudoeste, em uma escola da zona rural de Brasília, que se destaca pelo pioneirismo e dinâmica da diretora Lilian Kelly de Oliveira Silva e da sua equipe pedagógica. Com o Sonhe, Realize, o Centro Educacional Regina Velanes Regis, de Brazlândia, sai na frente, proporcionando uma reflexão e a produção de um planejamento de vida, que é de grande importância para a vida das alunas.
O Sonhe, Realize é um programa de mentoria e educação para meninas do ensino médio com foco no enfrentamento de obstáculos para seu sucesso futuro. O programa apoia as meninas a persistirem nos estudos e traçarem metas estudantis e profissionais, como forma de alcançar os seus sonhos.
Foi a professora Jacira Siqueira quem nos propôs trabalhar naquela escola rural. No projeto Sonhe, Realize, quase sempre, após a quebra do gelo, iniciamos a conversa fazendo perguntas que nos pareciam pueris para jovens alunas, uma a uma: quem é você? O que você quer ser? Quem você quer ser? No que vocês acreditam?
“Não sei quem sou”, é a resposta de mais de 90% das estudantes do ensino médio. Ao perguntar sobre os valores, a coisa complicou demais. Também há respostas “brincalhonas”: “Eu sou VASP,”.
Ah, então você é trabalhadora? – perguntei.
Todas riram. E ela cochichou no meu ouvido: “VASP é Vagabunda Anônima Sustentada pelo Pai”.
Essa resposta é emblemática do que os estudantes brasileiros pensam sobre o que fazem na escola. É como se passassem o tempo, como alguém que leva vida errante, perambula, vagueia, vagabundeia. As respostas revelam de forma preocupante como as jovens veem a escola brasileira! Escola é um passatempo, sem nenhuma importância. Como não entendem a escola como lugar de aprendizagem, como planejar o sonho?
As respostas e as não respostas mostram o quão distante a escola brasileira se encontra das necessidades dos alunos. Eles não se sentem alunos que recebem instrução ou ensino de alguém, muito menos alguém que segue os conselhos, ideias ou doutrinas. Em todas as escolas que estivemos, depois de vários exercícios e encontros, conseguíamos a resposta das meninas, a escrita de um plano de vida para um ano, na direção do seu sonho. Por onde passamos as meninas reagem aos poucos e no final entregam o seu plano em envelope lacrado e após um ano o enviamos para o seu endereço.
Em muitas escolas, a maioria das estudantes parecia anestesiada pelo cotidiano escolar, esmagada pela rotina, pela aceleração das aulas, sem saber onde está e para onde quer ir.
E o meu susto não foi maior, porque eu havia lido uma entrevista de Maria Shriver, sobrinha do ex- presidente dos Estados Unidos John Kennedy e filha da idealizadora das Paraolimpíadas e do fundador do Peace Corps. Ela se casou com Arnold Schwarzenegger, astro de Hollywood e ex-governador da Califórnia.
Bem que se quis, depois de tudo, ainda ser feliz, como diz a canção. Assim, ela entrou numa tremenda crise de identidade. Enquanto lutava para reencontrar o seu caminho, foi convidada para discursar numa solenidade de formatura do ensino médio. E perguntou-se: “Mas que conselhos eu vou dar àqueles jovens se nem eu sabia mais quem eu era”? Depois de muito pensar, percebeu que a resposta estava em sua incapacidade de descobrir dentro de si os seus desejos, sonhos, sua essência, como ela diz. E que nunca é tarde para se tornar a pessoa que você quer ser. É preciso reinventar-se, e nos ofereceu um precioso discurso sobre projeto de vida, que a turma de formandos do ensino médio, da qual foi patrona, e seus pais sugeriram que fosse transformado num livro.
A primeira questão da Maria Shriver é: Desde pequena nos perguntam: – O que você vai ser quando crescer? – Mas ninguém – nem nós mesmos – faz a pergunta mais importante: quem você quer ser?
Mesmo tendo escolhido ser jornalista na adolescência e nessa profissão fez muito sucesso, ela conta que não foi fácil o caminho que teve de trilhar para se reencontrar, encontrar a sua verdadeira identidade.
E de questão em questão, durante o discurso a autora vai tentando entender por que foi convidada. Ela vai discorrendo sobre a fama, sobre ser famosa, dizendo-se conhecedora de pesquisas que revelam que o que as pessoas dessa geração mais desejam é ser famosas, e ponto final. “Nos últimos anos, vimos tantas pessoas ficarem famosas – e para quê”?
“Acreditem ou não, a fama por si só não é capaz de fazê-los felizes. Nem de fazer com que se sintam dignos e respeitáveis. Quero dizer que a única maneira de se sentirem dignos e de bem com vocês mesmos – a única maneira de construírem uma vida plena de sentido e alegria – é encontrando sua própria voz, trilhando seu próprio caminho, seguindo seu próprio coração e vivendo sua própria vida, e não a imitação da vida de outra pessoa.”
Parabéns à professora Maria Helena Guimarães, que, como disse o professor Arnaldo Niskier, “resolveu cuidar mais de perto também do ensino médio, que requer atenção especial”.
Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em Educação. Foi deputada de 1991 a 1999. Preside a Casa da Educação Anísio Teixeira. É diretora da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise – ABEPP – e membro da Soroptimist International SI Brasília Sudoeste.