*Maria José Rocha Lima
Falar sobre Anísio Teixeira é reconstruir a trajetória da luta em defesa da escola pública, laica, gratuita e de qualidade. Atual, ele inspira, orienta e ilumina os caminhos dos que só acreditam na democracia com um povo educado.
No Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, publicado na íntegra pelo jornal O Globo, em 28 de março de 1932, eles inscreveram: “Na hierarquia dos problemas nacionais, nenhum sobreleva em importância e gravidade ao da educação. Nem mesmo os de caráter econômico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstrução nacional”.
Cinquenta e cinco anos após o Manifesto dos Pioneiros e inspirados neles, foi lançado em Brasília, a 9 de Abril de 1987, o Fórum da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito[2]”. Assim, os pioneiros iluminaram as discussões na Assembleia Nacional Constituinte de 1988.
No Fórum em Defesa da Educação nas Constituintes Nacional e Baiana, como representante da Confederação dos Professores do Brasil – CPB -, defendíamos as ideias de Anísio: “O ensino obrigatório dever-se-ia estender progressivamente até uma idade conciliável com o trabalho produtor, isto é, até aos 18 anos, porque a obrigatoriedade do ensino é mais necessária ainda na sociedade moderna em que o industrialismo e o desejo da exploração humana sacrificam e violentam a criança e o jovem, cuja formação é frequentemente impedida ou mutilada pela ignorância dos pais ou responsáveis e pelas contingências econômicas”.
Também foi de Anísio a ideia da jornada integral: “Estendido o tempo da escola primária pelo dia letivo completo e pelos seis anos mínimos de estudos, teríamos a possibilidade de reorganizá-la para a educação de todos os alunos e não apenas dos poucos selecionados”.
Lembrava que os filhos dos ricos têm um turno na escola e, noutro turno, dispõem de estudos acompanhados, aulas de dança, línguas e esportes, além de livros etc., enquanto os filhos dos trabalhadores contam apenas com minguadas três horas e meia de aula e no outro turno desaprendem o que aprenderam no turno anterior.
A criação de fundo para destinação de recursos de acordo com o custo aluno foi uma das elaborações mais impactantes do educador baiano: “Precisamos (…) constituir fundos para a instrução pública, que estejam não só ao abrigo das contingências orçamentárias normais, como também permitam acréscimos sucessivos, independentemente das oscilações de critério político de nossos administradores”.
Quase um século depois da proposta dos pioneiros, foi criado o FUNDEF[3], em 1996, sob as suas inspirações, mas deixando de fora a educação infantil e a EJA e destinando apenas 60% dos recursos para pagamento de professores. Diferentemente do fundo idealizado por Anísio, que propunha fundos que atendessem da educação infantil até a educação dos jovens.
Em 2006, foi criado o FUNDEB[4], que avançou na universalização da educação básica, em caráter provisório, com vigência até 2020, mas com recursos insuficientes para atender a todos os níveis de ensino e destinando apenas 60% para pagamento de professores.
Em 2020, foi aprovado o FUNDEB mais avançado da história, com muita luta. O maior dos avanços é torná-lo permanente, incluído no corpo da Constituição Federal; atende a todos os níveis da educação básica, incluindo creches, adotando medidas de impacto sobre a educação infantil; adotando mecanismos para redução das desigualdades; e o mínimo de 70% dos recursos para pagamento dos professores.
Para manter a tradição da meia vitória, incluíram profissionais de educação para dividir os recursos que seriam apenas para o pagamento do piso salarial do magistério.
O legado de Anísio Teixeira para a geração atual e as gerações futuras é de que “só pela escola se pode construir a democracia” e de que, “dada à absoluta penúria da escola pública, democracia é ainda uma palavra vã, usada para justificar a farsa triste de um sufrágio universal irrisório”.
* Maria José Rocha Lima é mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia. Foi deputada de 1991 a 1999. É presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira e dirigente da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise – ABEPP.
O FNDEP foi composto por 15 entidades: CUT/CGT/OAB; ANPED/SBPC/SEAE/CEDES; sindicais de educação -ANDES/ANDE/CPB/FENOE/FASUBRA/ANPAE-; estudantis UNE e UBES.
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério –FUNDEF
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB